quinta-feira, 19 de julho de 2012

A virgem

Maria Rita sempre tivera uma personalidade forte. E põe forte nisso! Ela nunca ia pela cabeça dos outros e, desde pequena, defendia seus argumentos como qualquer adulto. Às vezes ela não estava certa, é claro, mas, mesmo assim, continuava firmemente com o seu ideal. Quando colocava algo na cabeça, ninguém tirava dali. Ela ia até o fim.
Um certo dia, aos 8 anos, Maria Rita chegou para sua mãe e disse:
- Mãe, a senhora não vai ser avó.
- Não vou ser avó? Por que isso agora, Maria Rita? De qualquer maneira, você ainda é muito nova para pensar nessas coisas.
Não se intimidando pelos comentários da mãe, a garota continuou:
- Decidi que quero morrer virgem.
A mãe, que estava bordando um pano, virou-se e encarou a filha. A coisa estava começando a ficar séria.
- Desde quando você sabe o que é ser virgem, minha filha? E quem enfiou essa história na sua cabeça?
- Ninguém enfia nada na minha cabeça, mãe. Só decidi que quero morrer virgem.
- Querida, esses assuntos ainda não são para você. Além do mais, você nem sabe o que é ser isso direito. Quando você crescer, vai achar graça disso.
- Não, não vou. Vou morrer virgem.
E saiu saltitando para brincar com suas bonecas.
Crianças inventam tanta coisa, pensou a mãe. Isso é apenas uma fase. Com certeza ela teria visto aquilo em algum filme ou novela e decidiu repetir, como acontece com toda criança. Morrer virgem, tem até graça. Logo a Maria Rita, que é tão espevitada? Nunca. Daqui a uns vinte anos, vou estar correndo atrás dos meus netinhos pela casa. A mãe acalmou-se e esqueceu o assunto, já que não lhe deu muita importância. Não mencionou o ocorrido a ninguém.
Só que, como já foi dito, Maria Rita vai até o fim. Aos 12 anos, sentada na mesa comendo a ceia de natal, escutava a mãe contar entusiasmada para os parentes que a sua garotinha agora era uma mocinha.
- Não acredito! A Ritinha? Mas lembro que até ontem a segurava nos braços.
- Pois é, como o tempo voa!
E o pai comentou:
- Voa mesmo. Daqui a pouco eu serei avô.
E Rita, que estava prestando atenção à conversa mas que se mantivera calada até então, abriu a boca e perguntou, inocentemente, ao pai:
- Papai, o senhor amaria um neto adotado, não amaria?
- Adotado? – Pego de surpresa, continuou: - Claro, filha... Mas, um adotado nunca substitui um neto que tem seu sangue, não é?
- Mas eu não vou ter filhos. Vou morrer virgem.
Todos se entreolharam confusos por um segundo. Aquela menina entendia o que estava dizendo?
Até que o silencio foi quebrado:
- Você vai querer ser freira, é isso, Ritinha?
- Não, tia.
Durante toda aquela noite não se falou mais naquele assunto, todos estavam receosos demais. Porém, no outro dia, Maria Rita era o assunto de todos da família. Até o tio que estava de férias no Paraguai soube o ocorrido. Era só no que se falava, embora ninguém levasse a sério as palavras da criança. A notícia era dada como se fosse uma piada. A garota só tinha 12 anos e queria morrer virgem, vejam só!
Maria Rita fez 13, 14, 15, 16... e aí veio seu primeiro namorado, o que fez os pais pensarem que, lógico, ela tinha desistido da ideia absurda.  Mas não. Ela tivera 4 namorados e todos haviam arranjado um jeito de acabar com o relacionamento quando descobriam a maluquice que ela insistia em levar em frente. Nenhum durava. Ninguém a amava. Por vezes, a pobre menina quis desistir da sua promessa, mas seu ego era maior que a vontade. Ao ser indagada o porquê de tudo aquilo, ela apenas respondia:
- Quero alguém que me ame. Quero a pessoa certa.
Difícil ser diferente de todo mundo, ela bem sabia disso. Mas, de um jeito maluco, ela acreditava poder fazer a diferença. Ela acreditava estar plenamente certa. Ela acreditava que o problema não era ela, era o mundo, os outros. E quem poderia ir contra à tal irredutível pessoa?
Como o texto é meu e como eu escrevo que me der na telha, vamos ao fim bonito e previsível.
Maria Rita teve a coragem que as Marias Ritas do mundo não têm: a coragem de não desistir, seguir em frente. Aquilo já era questão de honra.
Começou seu relacionamento “sério” (com as aspas, ainda, porque o segredo ainda não tinha sido revelado) com o quinto cara e, decepcionada com a vida e com as pessoas, não esperou muito. Mas ela era direta, sem rodeios, sem pausas, sem vírgulas – diferentemente da simples mortal que vos escreve - , e, como fizera quatro vezes antes, segredou, numa tarde, o seu desejo ao namorado.
-  Você precisa saber de uma coisa...
- O quê?
- Eu quero morrer virgem.
- Eu também quero contar uma coisa.
- O que é?
- Te amo.
E foi ali que a menina que não queria ser mulher soube: tinha encontrado a pessoa certa. Procurou, procurou, procurou e finalmente havia encontrado o seu encaixe. A garotinha que com 8 anos viu num filme uma garota de 16 dizendo à sua mãe que queria morrer virgem só para poder convencê-la de que não iria fazer nada de errado numa festa, e correu para imitar a fala expressiva e legal que achara para sua mãe, e depois só continuou aquilo por pirraça, porque não queria voltar atrás, porque queria mostrar às pessoas que ela estava certa – nem ela mesmo tendo certeza disso, agora encontrara alguém que não ligava para aquilo. Era isso mesmo? Maria Rita 1, Sociedade 0?
A senhorita virgem noivou, casou e começou a morar junto. E depois teve filhos. Não, não eram adotados. Isso é só mais um texto bobo e meu, então eu termino assim:
Ela teve relações sexuais, mas morreu virgem. Virgem de influências alheias. Porque quis assim. Porque eu quero assim.
Vamos combinar, a Ritinha era muito espevitada, não é mesmo?
Morreu Virgem. Com letra maiúscula, uma vez que é mais expressivo. E uma vez, é claro, que o texto é meu. Que vocês todos sejam as Marias Ritas do meu texto inventado, e que o destino seja um escritor tão generoso quanto eu, modéstia à parte.

domingo, 15 de julho de 2012

Refúgio

Ainda não cheguei a esse patamar. Minha bagunça (ainda) concentra-se apenas no guarda-roupa, hein?
Lembrar de coisas boas é tão bom. Se dar aquela geral no seu guarda-roupa tem um lado positivo, com certeza esse é encontrar boas recordações. Coisas que te marcaram muito, mas que com a correria você acabou esquecendo. Esqueceu de como estava feliz naquele dia. Esqueceu das pessoas que gostou um dia. Esqueceu dos presentes que ganhou. Esqueceu dos momentos que passou com aquela roupa bonita. Esquecemos muito fácil. Muito mais fácil do que lembramos. Preferimos nos concentrar nos momentos ruins. Nos problemas. Nas infelicidades. E esquecemos tudo de bom que vivemos - e, podem apostar, foram muitas coisas.
Hoje, arrumando a parte do guarda-roupa onde eu guardo livros e papéis, foi isso que aconteceu. Lembrei de tanta coisa! Vi meus testes e provas antigos, vi uns trabalhos e me lembrei de como eu os tinha feito, li muito texto besta sobre assuntos mais bestas ainda. Não tive coragem de jogar nada fora. E podem me dizer que eu não posso me apegar ao passado e tenho que focar no futuro. Mas eu morro de pena, gente. São pedaços meus, ali.
Não quero pôr fora minha reportagem sobre trabalho na adolescência que foi feita em grupo e na qual eu entrevistei um professor e o porteiro lá da escola. Me senti o máximo escrevendo "nessa entrevista exclusiva". Não sabia que soaria tão cômico depois de um ano.
Não tenho coragem de jogar fora o meu mini-livro "A Certeza do Caos", que foi um trabalho de história sobre a Primeira Guerra Mundial. Deu um trabalhão, principalmente porque só tivemos uma semana para fazer tudo, mas foi gratificante ver meu 10,0 no final.
Recuso-me a jogar fora minhas provas do 6º ano. Minha letra era horrível e é bom lembrar dela. E minhas redações? Aquelas fofuras cheias de erros.
Dentre tantas outras coisas...
Sabe, por mais que eu não perceba, evoluí. Cresci, aprendi a argumentar melhor, a escrever melhor, melhorei a letra... e um monte. Lembrar disso me renova.
Não jogo fora de jeito nenhum porque, se eu já esqueço tão facilmente dos bons momentos tendo tais coisas em meu poder, imagina se eu me livrar delas? Vou querer lembrar e não vou poder. Quando eu estiver me sentindo frustrada e a pior pessoa desse mundo, já sei ao quê recorrer: aos meus papéis e cadernos velhos. Lembrarei que sim, já vivi boas coisas. 
E, no fim, o guarda-roupa nem ficou lá essas coisas. Continua entupido de papéis que, para muita gente, só ocupa espaço, mas que, para mim, são um refúgio particular.

domingo, 8 de julho de 2012

Alegria de pobre... é para sempre

À tarde de um sábado calorento, seis pessoas estavam quase sufocando no banco de trás de um táxi, onde só deveriam estar três. Sim, três estavam no colo das outras três, batendo a cabeça no teto do carro quando este passava por uma lombada. Uma ia no banco da frente, indicando o caminho. A tia, mais velha, trazia nos olhos a alegria de uma criança, não parando de falar sobre as horas no shopping e o quão feliz é ser pobre. Não, ninguém da história é realmente pobre. Todos têm casa e comida. 
Porque se eu fosse rica, dizia, não seria tão feliz assim. E saiu dando exemplos de famosas que diziam não serem felizes. As pernas da pessoa do meio estavam dormentes com 46 quilos no seu colo. Mas só era lembrar da tarde para o sorriso voltar ao rosto. 
As sete pessoas, que pertenciam a mesma família, haviam se encontrado sem querer (porque pobre sempre se encontra, dizia a tia). Três tinham ido comprar algo, as outras quatro só para passear, tentando animar uma que estava doente. 
Cheias de sacolas, com um pacote enorme de fraldas na mão, um bebê no colo, sapatos que estavam incomodando, cadernos, guarda-chuva e jornais, as pessoas (a tia chamava de sem-tetos, mesmo) foram lanchar algo. 
Juntaram as mesas e riram até a comida chegar. Depois comeram enquanto riam. Ao acabar de comer, continuaram rindo, já que o garçom demorava a dar a conta. E rindo sobre o quê? Rindo sobre como pareciam retardados ao rirem. Riam de implicarem tanto uns com os outros, ou seja, riam de tanto se amarem. Porque a gente só implica com quem ama. "Olha aquela família de loucos!", não me admiraria se alguém apontasse e dissesse. Engraçada foi a parte em que uma pessoa tentava imitar um ataque alérgico para não pagar a conta. Não, ninguém fez isso. Só parecem não ter juízo, mas têm.
De barriga cheia, tiraram todas as sacolas, e fraldas, e bolsas e guarda-chuvas de onde tinham colocados e foram brincar, porque ninguém deixa de ser a criança que é ou foi um dia. Fizeram gols, bateram muito uns nos outros no carrinho bate-bate e quebraram o recorde de pontos no basquete em toda a história do estabelecimento (mas não ganharam nada por isso, talvez - e somente talvez - porque estavam jogando quatro pessoas onde deveria ir apenas uma só).
Nada mais para fazer, dinheiro já gasto, volte ao primeiro parágrafo e lembre do táxi. Muito simpático, aquele taxista. Todos dizendo veementemente que não cabiam sete ali, e ele dizendo que sim. E no fim coube. Muito apertado. Já disse que tinha gente quase sufocado? Exagero. Estava todo mundo muito bem, e muito feliz também. Porque eram pobres. Alegria de pobre é sem falsidade, é singela, é para sempre. E a mãe, que estava no banco de trás com seu filhinho de 2 meses no colo, logo apressou-se em alertá-lo:
"Se acostume, meu bem, essa é sua família agora".

Baseado em fatos verídicos. Desculpa se ficou confuso, foi só porque eu não quis citar nome de ninguém.
Amo vocês, família <3

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Incerto futuro


Desde que eu me entendo por gente, eu digo que quero ser médica. Acho que é um dos sonhos mais comuns das crianças, principalmente das meninas. E tem toda aquela coisa de salvar vidas, ganhar bem, vestir somente branco, ter um consultório só seu, escutar os batimentos cardíacos com o estetoscópio - coisa que eu sempre quis fazer. Sempre que eu contava esse meu sonho para alguém, a pessoa era toda sorrisos e elogios para comigo, o que fazia meu ego infantil explodir de orgulho de uma coisa que eu nem era ainda mas pretendia ser quando virasse adulta, é claro.
Mas aí eu cresci. Saí da ignorância e comecei a me perguntar se era aquilo mesmo que eu queria. Será que eu quero mesmo me matar de estudar para o resto da minha vida, estar sempre viajando, passar noites em claro dando plantões, mal ter tempo de me coçar e de cuidar da família que eu sonho ter um dia? 
Porque eu até acho que esse negócio de ser médica foi algo que me impuseram indiretamente. Claro que eu poderia ser professora, mas se eu quisesse comprar livros, roupas, acessórios, filmes e fazer as viagens que eu sonho, ia ficar só querendo mesmo. Alguém me entende?
Nossa, eu acho linda a ideia de salvar uma vida, devolver chances de recomeçar a alguém que estava quase partindo dessa para uma melhor, mas para ser médica, ao meu ver, eu terei de abrir mão de muitos outros sonhos. Como a gente faz quando não dá para conciliar todos os sonhos que se sonha? 
Além do mais, eu amo escrever. Não, não faço isso nada bem, mas mesmo assim eu gosto. Gosto de como, à cada palavra rabiscada, eu vou me sentindo mais e mais e mais leve. Mesmo que ninguém leia, já decidi: vou publicar livros num futuro próximo. Às vezes penso de desistir do vestibular de medicina e fazer jornalismo. Ou ainda letras, porque, mesmo que professor não seja lá uma profissão bem remunerada, é uma das que eu acho mais nobres. O professor passa seus conhecimentos aos alunos. Conhecimento é poder. Logo, pelo princípio da lógica: o professor dá poder aos alunos. Isso não é lindo?
Ainda faço primeiro ano do Ensino Médio e vivo me atormentando por isso. Talvez, no fim, eu acabe sendo uma médica sem tempo para qualquer outra coisa, ou uma escritora frustrada, ou uma professora sem dinheiro para viajar para o interior do próprio estado, quanto mais para o Canadá, país o qual sonho conhecer desde os 13 anos. Ou, talvez, ainda, porque nunca se sabe já que a vida é traiçoeira, eu acabe sendo a última coisa que eu tenha sonhado. 
Mesmo que eu precise abrir mão de sonhos antigos, mesmo que eu não me torne lá 100% realizada, eu só espero que eu não me arrependa no meio do caminho. Eu quero olhar para trás e dizer: fiz a coisa certa. 

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Os Imortais: eu li

Eu não sou muito de falar de livros por aqui. Só que, após conseguir, finalmente, terminar de ler a série Os Imortais, senti-me obrigada a falar dela aqui. Afinal, foram uns dois anos para eu ler tudo.
Quem ler série, sabe como isso é horrível. O livros sempre acabam na melhor parte. E quando você vai atrás do próximo, não o encontra - ou, se o encontra, não pode comprar. E quando finalmente consegue, simultaneamente, encontrar o livro enquanto tem dinheiro para comprá-lo, nem lembra mais o que aconteceu no último lido. 
A minha tia foi quem me presenteou com o primeiro livro da série. Li e gostei. Muitos meses depois comprei o segundo, que li numa manhã só de tão envolvida que fiquei e também porque não tinha muita coisa para fazer, pois estava de férias. O terceiro, Terra de Sombras, só veio nas férias seguintes. O quarto foi presente. O intervalo entre o quinto e sexto livro foi o menor de todos, acho que não passou de um mês, isso porque eu abusei muito minha querida mãe. Não aguentava mais me deparar com uma personagem no meio da história e me perguntar: quem é essa e de onde saiu, pelo amor de Deus? Só depois eu lembrava da coitada, que de tão secundária foi ofuscada pelas personagens principais - Ever (que é muito imatura e faz tudo errado) e Damon (que, só para constar, é descrito pela autora como o namorado perfeito que toda adolescente bobinha e romântica, assim tipo eu, queria ter: é bonito, fofo, inteligentíssimo, sexy, esperto, carinhoso e, o mais importante: ama-te incondicionalmente, não se importando pelas besteiras que você fez ou fará, porque vocês foram destinados a ficar juntos... quem não queria um desses, me diz?)
Longe de mim resenhar os seis livros. Primeiro porque eu teria que lê-los novamente, já que a história é tão complexa e cheia de detalhes que eu não lembro de tudo. Segundo porque isso demanda esforço e eu, no momento, estou com frio, preguiça e louca para ir assistir Friends, pois minha prima (obrigada, Thayná) me emprestou uns DVDs com a primeira temporada inteira. 
Então, o que vocês precisam saber: Ever e Damon têm problemas, problemas, problemas e mais problemas.  Eu até que poderia dar uma de contra spoilers, mas, caramba, quem não pode deduzi o final disso? Sim, logicamente eles terminam juntos e felizes.
Do jeito irônico que eu estou escrevendo parece até que eu não gostei dos livros. Muito pelo contrário, eu os amei. Morri e ressuscitei de raiva quando, durante os primeiros cinco livros, a Ever só fez burrada. Admito, ela queria concertar as coisas. MAS ELA NUNCA FAZIA NADA CERTO! Ela só piorava tudo e depois ficava com aquele mimimi. Aí depois eu morria e ressuscitava novamente quando o Damon ia lá reconfortá-la. Eles continuaram juntos mesmo quando não podiam se tocar! É muito amor, só coisa de livro, mesmo...
Enfim, a Ever só vai tomar jeito e endireitar as coisas no sexto livro. É claro que a história é muitíssimo mais complexa que isso, tem dezenas de personagens. E, como eu disse, os dois passam por diversos problemas (a maioria causados pela Ever tentando solucionar outro). 
Eu particularmente gostei do final. Foi totalmente inesperado. Gosto assim, odeio livros previsíveis. Gostei tanto que deixei escapulir umas lágrimas. Não vou contar o final para vocês, porque, na maior inocência, animada com o fim da série, contei o final para a minha amiga (que também estava acompanhando, por influência minha, só que a uns dois livros antes) e ela quase me engole viva. Só vai ler quando tiver esquecido o que acontece. Eu sei, também odeio quando me contam finais, mas vocês têm de perceber que eu estava muito emocionada. Da próxima vez, só o meu diário fica sabendo. 
Foram seis livros, acho que quase umas duas mil páginas, mas, como eu sou legal e amigável, vou resumir a série inteira em uma linda e emocionante frase para vocês colarem na porta de suas geladeiras:
Não importam as barreiras, não importa a época, não importam as conspirações das pessoas, não importam quantas vezes você reencarne: sua vida já está escrita, você e sua alma gêmea vão sempre se reencontrar e, se estiverem destinados a ficarem juntos, assim será, para sempre... porque, talvez, o para sempre exista.

quarta-feira, 4 de julho de 2012

O produtinho* do século XXI


- Ô mamãe! Mãe, mãe, mãe! Vem lápido!
- O que foi, querido, que houve?
- Vem lápido!
E lá foi a mãe, largando os pratos ensaboados na pia, à procura do seu filhinho.
- O que aconteceu, meu anjo?
- Na hola que eu ia matar o monstlo tudo ficou pleto.
- Foi só porque acabou a energia. Já, já volta. Você pode ir brincar com outra coisa enquanto espera, querido.
- Tá bem...
Ele foi ao seu quarto ligar o computador, já que o videogame não funcionava. Como não conseguiu, correu ao encontro da mãe.
- Ô mamãe, o computador não liga!
- A mamãe não explicou que está faltando energia?
- Mas faltou nos dois?
- Faltou no bairro inteiro, filho.
- Ah...
Sem computador, sem videogame, o que faria ele? Tentou ligar a televisão, mas nada. O celular descarregado não carregava. As luzes dos cômodos não acendiam. O microondas não preparava sua pipoca. O chuveiro elétrico não esquentava sua água. Seu sorvete tinha derretido. Seus carrinhos não tinham graça, pois não andavam sozinhos. Seus soldadinhos não arrancavam a cabeça dos seus monstros. Os seus zumbis não se levantavam sozinhos das suas tumbas para assustar pessoas. E o mais legal também não acontecia: as suas pessoas de plástico não saíam correndo amedrontadas. 
Muito frustrado, foi à mãe novamente.
- Mamãe, assim não tem glaça viver.
- Daqui a pouco a energia volta, meu amor. Tenha paciência.
- Mas eu quelo blincar agola - e começou a chorar descontroladamente.
A mãe, pegando-o nos braços, tentou reconfortá-lo.
- Você tem vários brinquedos, querido!
- São todos uns chatos! Eles não matam, não falam e nem se mechem.
- Mas, amor, essa é a parte legal. Você tem que imaginar o que quer que eles façam.
- São chatos! São chatos!
Em meio a soluções, pegou no sono. A mãe deitou-o e enrolou-o na cama. Saiu dizendo a si mesma:
- Agora, sim, eu percebi. Estamos no século XXI.

* produtinho, no título, é só o diminutivo de produto, não foi empregado de maneira pejorativa, só para esclarecer. Até porque eu também sou quase um produto desse século, né. Nasci em 96.

terça-feira, 3 de julho de 2012

Pode ser paranoia... ou não

- Querida, você não vai acreditar!
- Acreditar em quê, amor?
- Comprei um carro! Agora nada de ficar horas em pontos de ônibus nem em qualquer esquina à espera de táxis.
- Que legal, amor, muito legal.
- Você não está feliz?
- Oi?
- Eu perguntei se você não está feliz.
- Ah, é claro que sim.
- É claro que está ou é claro que não está?
- É claro que estou, querido. Você pergunta cada coisa.
Convenhamos que homens não são lá de notarem muito, mas dessa vez o Paulo se preocupou muito com a sua namorada. Namorada, ainda. Iriam se casar dali a três meses, mas já moravam um com o outro a pelo menos uns seis. Quiseram primeiro conviver juntos e ver se se aturariam. Se desse certo essa experiência de marido e mulher durante nove meses, então a vida deles como casados correria maravilhosamente bem. Partiram da ideia de que só convivendo se sabe quem é quem. 
- O que você tem? Aconteceu alguma coisa? No trabalho, faculdade? Alguma coisa que eu deveria saber?
- Não, nada, querido. Só um enorme trabalho que preciso entregar e apresentar amanhã. E sobre o carro, se foi isso que o deixou encucado, fiquei feliz, sim, muito. Estávamos precisando de um e nosso orçamento está tão folgado que não vamos ter problemas na hora de pagar.
Ele sossegou. Mas, depois de algumas horas, já tarde da noite, enquanto assistiam TV, notou outra vez alguma coisa diferente nela.
- Não acredito que o Marcos vai voltar com a Maria. E isso só porque ela está grávida. Que se dane. Aposto que ela engravidou justo para segurá-lo. Essas coisas sempre acontecem. Lembra daquela última novela das sete, querida, quando a Joana engravidou de propósito só para o João se casar com ela?
- Lembro, sim.
- As coisas nunca dão certo quando não são planejadas. Veja só nós dois: primeiro decidimos morar juntos para testar nossa compatibilidade, e depois, quando estivermos certos de que fomos feitos um para o outro, nos casaremos.Quais as chances de dar errado? Quase nulas. As coisas são tão simples, as pessoas que complicam, sabe, querida?
- Sabe o que?
- O que eu disse, sobre planejar.
- Ah, claro, planejar é muito bom.
- O que diabos você tem hoje? Tenho certeza de que não é droga de trabalho da faculdade nenhum. Você está me escondendo algo. O que foi? Será que não confia em mim?
- Claro que confio. Eu não tenho nada, já disse.
- E eu não acredito, já disse.
- Acho que vou dormir mais cedo hoje. Boa noite.
- Ah, Flávia, não vai ficar com raiva de mim, vai?
- Não. Quem foi que disse que tem alguém com raiva aqui?
- Ainda bem, porque quem deveria estar com raiva era eu.
- Você? Como assim você? Eu faço de tudo para te agradar, nem reclamo da toalha molhada que todo santo dia você deixa em cima da cama, nem das meias espalhadas pelo chão, nem das descargas não dadas, nem dos respingos de xixi que você deixa no banheiro, nem da TV que você esquece ligada, quer mesmo que eu termine? - Ele balança a cabeça negativamente e ela continua: - Eu que deveria estar morta de raiva. Morta e enterrada.
E levantando-se, pôs-se de pé à frente dela e olhou-a nos olhos. Tinha visto numa revista que isso funciona muito bem para persuadir mulheres.
- Olha, meu bem, eu juro que discutir é a última coisa que eu quero fazer com você. Só queria saber por que você está tão avoada hoje, o que te preocupa. Somente isso. Poderíamos dividir suas preocupações. Você sabe que eu te amo e que não fico com raiva de você por mais que um minuto, não sabe? Que tal me contar o que aflige esse coraçãozinho? 
E jogando-se nos braços dele (lê-se: dicas de revistas ainda podem funcionar, quem sabe), ela responde:
- Paulo, não é bem assim. Eu preciso ainda confirmar uma coisa. Não quero te preocupar à toa.
- Mas eu quero saber. Ei, psiu, olha para mim. Se queremos ter algo duradouro futuramente, precisamos compartilhar até nossas dúvidas. E, além do mais, já convivi tempo suficiente com você para lidar com  sua  TPM.
- Amor, esse é o problema... Eu não contei porque eu... Eu pensei que fosse só paranoia minha... Mas já que você coloca a coisa assim... E também já que hoje é dia 3... Querido, eu quero que você sente... Isso, melhor... Agora você respira fundo... Paulo, eu posso estar grávida, só posso. É uma possibilidade. Minhas menstruação nunca foi das mais certinhas mesmo, pode ter atrasado. Eu sei que isso frustraria nossos planos, mas não foi culpa nossa. Você sabe, sempre tomamos todas as precauções possíveis. Por isso eu acho que pode ser parano...
E ele tomou-a para um beijo gostoso, profundo. Depois partiu-o e disse:
- Quer dizer que o Paulão aqui vai ser pai? E você não iria me contar?
- Eu não disse que você vai ser pai, disse que você pode. E eu iria contar. Mas aí você veio com aquela história de planejamen...
Ele gostava daquilo.
- Você precisa parar com isso!
- Não quer mais me beijar?
- Não, né! Quero poder terminar minhas frases. O que eu estava dizendo mesmo? Ah, e sobre tudo aquilo de planejar? E sobre a mulher estar querendo prender o homem? Você me conhece, não estou te prendendo a mim. Nunca. Sem essa. Sou totalmente sem amarras.
- Você é muito engraçada, meu bem. Será que você não entende que sou um homem bem-resolvido? Já nasci preparado e engajado e planejado...
- ... e amostrado. Tinha esquecido desse seu la...
- Psiu, não acabei! E será que você não entende que estou preso a você desde aquele dia que nos vimos no clube?
Ela sorriu.
- Realmente, você é paranoica, viu, amor? Ficar enfiando essas coisas sem sentido na cabeça e levando meus comentários sobre novelas a sério. Aquilo é ficção, isso é real! Quem se interesse se a Joana da novela quis prender alguém? Eu vou ser pai!
- Você quis dizer: eu poderei ser um pai...
- Quer saber? Vamos tirar essa dúvida. Só é ir lá na farmácia e comprar testes. Depois você faz um exame de sangue para ter 100% de certeza. Simples. Você que vive complicando as coisas. Todo mundo vive complicando as coisas.
- Claro, senhor bem-resolvido, mas a essa hora a farmácia já fechou.
- Não a do outro lado da cidade.
- E você jura que vamos até o outro lado da cidade só comprar um teste de gravidez? É mais jogo esperar até amanhã de manhã.
- Não, é mais jogo inaugurar o nosso mais novo carro, esqueceu? Pega a bolsa e vamos logo. E cuidado com essas escadas, soube que a dona Carla, do 273, caiu outro dia. É melhor irmos de elevador. Vem.
E ao entrar no elevador:
- Boa noite, seu Joaquim. Sabe da mais nova? Eu vou ser pai.
- Não, seu Joaquim, ele disse que poderá ser um. Não temos certeza ainda.
- Eu tenho certeza. Sabe, homem sente essas coisas.
- Ah... lógico que sim. 
Nove meses depois nascia o João Victor. Isso porque o pai dele se chamava João e o dela, Victor.

domingo, 1 de julho de 2012

I S2 Holmes

Eu sou muito medrosa, muito mesmo. Acho que no dia que eu levar um susto grande, morro do coração. Odeio filmes de terror, e os poucos que vi foram pela manhã e com alguém ao meu lado. Até romances policiais me dão medo. Só que, sabe aquele medo gostoso de se sentir? É o que eu sinto em livros onde há detetives e mortes. Por mais que me pareça assustador, por mais que eu ache, enquanto estou lendo, que alguém vai pular minha janela e me matar, não consigo deixar de ler até saber quem matou quem, como e por quê.
Tudo começou em setembro do ano passado, em Um Estudo em Vermelho, com Sherlock Holmes - por quem sou extremamente apaixonada, confesso. Já tinha lido uns contos de Sherlock Holmes antes. Tinha achado legal, sim, muito legal até, mas nada impressionante.
Num certo dia, então, minha mãe havia dito que eu podia comprar alguns livros pela revista. Passei os olhos e vi um box com três livros do famoso detetive, sendo que um deles fora mencionado pela minha professora de português dias antes - Um Estudo em Vermelho. Segundo ela, um dos melhores livros que já leu. Comprei.
Essa versão original é uma graça
Foi aí que eu me apaixonei. Pelo homem, pela técnica, pela inteligência, pelo charme (tá bom, charme é exagero). Tudo parece infinitamente mais simples sob olhar de Holmes. Às vezes me pego tentando deduzir coisas sobre algo ou alguém. Pura influência sherlockiana. 
Depois li um pouco de Edgar Allan Poe e de Agatha Christie. Em alguns contos, Poe me parece ter sido um sujeito um pouco perturbado, sério. Tem um conto dele sobre um gato preto e outro sobre nunca apostar sua cabeça com o diabo que são, no mínimo, sinistros. Já os romances da Agatha são meio que à la Sherlock. Inclusive, de vez em quando, ele é citado nas suas histórias. São romances legais. Gosto bastante do Poirot - mesmo que às vezes ele se ache demais - e da Miss Marple - que é uma velhinha encantadora.
Aprendi que tudo é um questão de observação. Você vê, mas nunca enxerga. Os pequenos detalhes serão sempre os mais importantes. Eliminando-se o impossível, o que restar, mesmo que seja improvável, é a verdade (Sherlock diz isso sempre).

Holmes para mim sempre será o melhor. Acho que porque ele foi o primeiro. Ele que me mostrou esse mundo. Admiro-o porque ele conseguia descobrir as coisas apenas com sua mente, com suas artimanhas. Sem nenhuma tecnologia. Sem aparelhos ultramodernos que detectam manchas de sangue imperceptíveis a olho nu. Sem câmeras de alta resolução. Ele nunca precisou disso, tinha seu cérebro. No máximo telegrafava para alguém querendo informações. Tudo bem que ele nunca existiu, mas o Sir Arthur Conan Doyle fez um trabalho tão perfeito que é como se ele realmente tivesse tido uma vida.
Hoje, com todo o respeito, é claro, os detetives têm tudo nas mãos. Todo tipo de tecnologia possível. GPS, câmeras. Vi uma vez na TV um detetive que tinha um aparelho que o fazia escutar uma conversa a vários metros de distância, tipo um ouvido biônico. E tudo isso é usado, geralmente, para encontrar amantes de homens casados. Imagina o estrago que Holmes faria com um desses!
Eu sei que tudo isso ajuda nas nossas vidas. O que seria de mim sem internet? Mas também acho que enquanto nos ajuda por um lado, nos prejudica por outro. Nossa vida é tão facilitada que deixamos de criar certas capacidades. O homem é capaz de correr numa velocidade de até 36 km/h. Eu não consigo correr tão rápido, e você? Quem é que prefere ir correndo quando se pode pegar um ônibus?
Enfim, fazia tempo que eu queria escrever sobre Sherlock. Só estou inspirada agora porque - finalmente - assisti ao filme Sherlock Holmes 2 - Jogo das Sombras. Ok, vamos combinar que o Holmes do filme é deveras cômico e que o Watson é uma segunda mente brilhante, coisa que não é retratada nos contos, que são extremamente metódicos e certinhos e onde o Dr. Watson é um indivíduo comum, que não enxerga algo nem quando isto está bem embaixo do seu nariz.
Holmes e o Dr. Watson
Além disso, tanto o filme um quanto o dois dão uma importância muito grande à Irene. De todos os (muitos) contos que já li, Irene só aparece em um, Um escândalo na Boêmia. Holmes chega a admirá-la, porque ela o engana, mas nadica além disso. Nada de se apaixonar. Mesmo assim, gostei dos filmes.
Entretanto sou suspeita. Sherlock Holmes, para mim, é o cara!