sábado, 21 de dezembro de 2013

Presente de Natal



 Aninhada no colo da mãe, ela assistia ao movimento desordenado de pessoas pela rua. Ficava imaginando quais compromissos urgentes teriam elas para andarem tão depressa, e quanta gente elas precisavam alimentar para levar tantas sacolas de comida. Ela, que mal tivera pão naquele dia. Ela, que tinha que dividir o leite meio azedo com os irmãos. Ela, que fingia ser princesa quando fechava os olhos.

Não moravam na rua, não. Moravam num barraco lá bem mais pros fundos; não dava para avistá-lo da rua principal, mas não era longe. Era um lugar fétido e infestado por ratos. Mas ela gostava da sua “casa”. Amarrando uma ponta do seu lençol na janela e a outra no armador mais próximo, e somando a isso um pouco de criatividade, dava-se para construir uma moradia digna de realezas. Ela puxava o irmão mais novo, que mal andava, colocava-o no seu colo de menina e fingia ser mãe. E ninava o garoto como se ele fosse sua boneca mais cara; ele caia no sono e era posto em cima da toalha que servia como berço real. Quem não gostava muito de toda essa bagunça era a mãe. Ralhava com a filha e dizia que aquilo não eram vezes de moça, que quando tinha aquela idade já era dona de casa e que lençol rasgado não alivia o frio do inverno.

A mãe eventualmente podia ser dura, mas era só porque os seus planos de transformar a vida da filha numa vida melhor que a que tivera estavam sendo frustrados. Ainda não tinha trinta anos, entretanto faltava-lhe dentes na boca e a pele era ressecada, os lábios sempre estavam feridos devido à exposição excessiva ao sol. Mãe solteira, vivia da pensão miserável deixada pelo marido e sonhava com o dia em que pudesse comprar pão, bolo e queijo todos dos dias. Sua maior ambição era assim mesmo, simples: não passar mais fome. Nenhum dos seus filhos havia completado os quatorze anos de idade ainda, mas todos já entendia bem o significado dessa palavra e a temiam tanto quanto a mãe.

À tarde, enquanto os irmãos mais velhos pediam dinheiro nos semáforos, a mãe, a garota e o irmão mais novo sentavam no vão entre duas famosas lojas. Quando alguém passava mais perto, a mãe esticava a mão e às vezes algumas moedas caiam ali. Isso acontecia com mais frequência quando o irmão chorava, seja por piedade, seja por vontade de calar aqueles choros. 

A garota olhava espantada todas aquelas vitrines quando ia chegando a época do Natal. Eram muitas luzes, muito brilho, muitos presentes. Não sabia que significado tinha aquela data, não sabia por que a comemoravam, só sabia que ela chegava e era mágico. Ela esquecia da comida que balançava dentro das sacolas e voltava seu olhar para a felicidade que a época prometia. Em todos os cantos existiam árvores enfeitadas com presentes aos seus pés e, vez ou outra, ela deixava a mãe e o irmão ali, ia atrás de uma dessas árvores e ficava se perguntado se algum presente ali embaixo era endereçado a ela. Voltava para a mãe, porque nunca a queriam ali por perto.

Foram sete anos sem presentes nessa data que, para ela, era tão vazia de significado e cheia de alegria. Um dia, sentada no mesmo vão com a mãe e o irmão, chegou um moço com uns presentes. Dizia participar de um mutirão que arrecadava brinquedos velhos, consertava-os e depois entregava-os novos a outras crianças. Ela abriu o seu presente enquanto a mãe ajudava o seu irmão com o dele. Nunca num olhar houve tanta emoção. Nas suas mãos, estava a boneca que seria a mais amada do mundo. Ela abraçou aquele homem que não conhecia, porém já amava. Finalmente, era Natal para aquela criança.

sábado, 14 de dezembro de 2013

Top 6: séries

Não entendo de séries. Não sei quais critérios deve-se levar em consideração na hora de analisar uma, não sei nomes de atores (existem algumas exceções, é verdade), não sei nome de diretor e nem presto atenção em trilha sonora. Abaixo, listo seis séries por ordem de preferência. Não sei dizer tecnicamente por que gosto delas, só gosto. Talvez um dia eu deixe de ser leiga nesse assunto. Veremos.

6. The Vampire Diaries 


 Comecei a assistir a The Vampire Diaries em 2011 e lembro de ter amado. Cheguei a ver uns dez episódios por dia, mesmo minha mãe reclamando a toda hora que aquilo não era saudável, que quando eu começava a assistir não sabia mais parar. Até um dia desses eu acompanhava a série, mas meu computador esteve com problemas por um tempo e eu parei, nem sei mais em que lugar. A verdade é que eu não estava mais gostando tanto quanto antes. O clímax dessa série NUNCA chega ao fim, é incrível. O ritmo não desacelera e isso meio que me cansou. A história fica dando voltas e voltas e voltas e na minha cabeça formou-se um nó. O que também me cansou, e acho que mais cedo ainda, foi o triângulo amoroso vivido por Elena, Stefan e Damon. Eu acho forçado e piegas. Além do mais, me incomoda o fato de todos dessa série serem extremamente bonitos. NADA contra gente bonita, é claro, mas uma concentração de seres com cabelos lisos e perfeitos, dentes brancos, magros e com uma pele invejável num lugar só? Suspeito. Eles são tão "perfeitos" (dentro desse padrão idiota da sociedade) que soa irreal. Não sei ainda se voltarei a acompanhar. Quem sabe.

5. Dexter

 Untitled | via Tumblr

Já no segundo semestre desse ano, eu fiquei doente e perdi alguns dias de aula. Em casa, tentei pensar em algo que me fizesse esquecer da maldita dor de garganta que estava sentindo. Resolvi começar uma nova série. E a escolhida, por motivos que eu não sei explicar, foi Dexter, que eu passei a amar desde o primeiro episódio. Sei que não tenho muita autoridade para falar, porque, afinal, só assisti às duas primeiras temporadas (isso em três dias, não tive vida nesse período). Mas o fato é que eu adorei o jeito leve e cômico de ser falar de um serial killer. Mais ainda: eu adorei entrar na mente de um serial killer. Os pensamentos do Dexter relatados em tempo real fazem você pensar, por alguns instantes, que você é o próprio Dexter. Vou voltar a acompanhar Dexter, sim, e isso não irá demorar. 

4. The Big Bang Theory

That smile.

Nenhuma série, até hoje, me fez rir tanto quanto The Big Bang Theory (nem mesmo Friends, acreditem).  Eu vejo e revejo os episódios, mas eles nunca me cansam e nunca perdem a graça. Pode ser dia de chuva ou de sol, The Big Bang Theory sempre vai ser amor em forma de série. E se, quando eu estou doente, quero me cantem Soft Kitty, a culpa é do Sheldon.

3. House

Puwr

House é um dos meus personagens ficcionais preferidos. Como não amá-lo? Às vezes ele pode ser grosso. Às vezes pode te dar vontade de esbofeteá-lo, mas a verdade é que ele está sempre certo. Como não rir das suas piadas? Elas são carregadas de humor negro e acidez e mesmo assim eu as acho sempre geniais. Como eu pretendo seguir carreira médica, os questionamentos éticos da série me são muito úteis. Quero ser tão boa médica quanto o House. Eu não assisto à série na ordem cronológica. Eu comecei fazendo isso, e acho que parei na terceira temporada. Agora, eu sempre assisto aos episódios quando estão passando na TV, seja lá em qual temporada estiverem. Isso prejudica, eu sei, o meu entendimento, mas é só que eu não quero ver todos os episódios de House, a verdade é essa. A verdade é que eu não quero que acabe. Nunca.

2. Sherlock

Sherlock and Watson

Melhor adaptação de Sherlock existente na face da Terra. Não sei se vocês sabem, mas Sherlock Holmes é minha paixão literária desde que eu pus os olhos em Um Estudo em Vermelho. Inteligente, sarcástico e dono de charme invejável, Sherlock Holmes tem um espaço enorme no meu coração. Já era muito fã dele quando decidi assistir a essa série perfeita da BBC. Foi amor, apenas isso. Pudera, uma vez que Sherlock é interpretado por nada mais, nada menos que Benedict Cumberbatch. A série mostra a realidade do detetive se ele vivesse no século XXI e todo episódio tem um trocadilho bem legal (até no título) fazendo referência a algum conto do Sir Conan Doyle. E uma das coisas que eu achei bem legal e que não vi retratada em lugar nenhum foi a questão do homossexualismo entre o Holmes e o Watson. Nos contos, o Watson foi muito bem casado e com três mulheres diferentes, enquanto o Holmes nunca se interessou em manter relação alguma com quem quer que seja, pois, segundo ele, paixão atrapalha o intelecto. Eles eram só muito bons amigos. Só que trazendo essa amizade dos tempos vitorianos para o mundo atual, acho muito sensato que seja retratada a dúvida: eles são só amigos ou algo a mais? Isso é o que se perguntam pessoas logo na primeira temporada da série, e eu acho justo. Inclusive, uma das coisas que me fez não gostar de Elementary foi o fato do Watson ser uma mulher (pronto, disse!). Mal vejo a hora da estreia da terceira temporada. Não é querendo soltar spoiler, mas o que foi aquele final? Como foi que aquilo aconteceu? Como pode? Só sendo o Sherlock mesmo.

1. The Walking Dead

The Vampire Queen | via Tumblr 

Tive sérias dúvidas com relação a esse 1º lugar. Mas já que The Walking Dead é a única série que eu acompanho religiosamente, nada mais que merecido. Já falei dela por aqui, porém nada do que eu diga será capaz de deixar claro meu sentimento de amor e medo por essa série. É claro que tudo é de mentirinha, mas eu sinto medo por eles e não por mim. Eu quero tanto saber onde isso irá acabar que eu comecei a ler as HQs. Há quem pense que essa é uma série sobre zumbis, eu também pensava assim. Mas, nada verdade, The Walking Dead é uma série sobre pessoas. Sobre o que fazemos para nos manter a salvo, aonde chegamos para proteger quem amamos. Não precisamos de um apocalipse zumbi, porque nós já estamos vivendo num apocalipse. Estou, por acaso, mentindo ao dizer que existe a possibilidade de não voltarmos vivos para casa? Que existe gente sem água para beber? Comida para comer? A única diferença entre série e vida real é que, na série, os personagens têm noção desse fato e, por isso, fazem de tudo para manter intacta sua humanidade. Alguns de nós, entretanto, não tem muita preocupação com a sua. Sem dúvidas, uma das séries que mais me marcou e me fez refletir. Que bom que um dia eu a encontrei.

sábado, 7 de dezembro de 2013

É tudo invenção?

Eu li, recentemente, uma reportagem sobre uma especulação de um renomado cientista chamado Robert Lanza. Ele dizia, simplesmente, como quem explica ao filho de dez anos de onde vêm os bebês, que a morte é uma invenção da mente humana. Invenção que algum homem das cavernas criou e que, por algum motivo, como dizem os adolescentes, "pegou".

E eu não sei se fico grata ou chateada com esse sujeito. A ideia de morte me é aterrorizante, já falei sobre isso por aqui (só a título de explicação: sou agnóstica), PORÉM é como todos dizem: é a única certeza que temos na vida. Toda a nossa vida é pautada em cima disso. Vivemos em função da morte: pagamos caixão antecipadamente, vamos ao médico uma vez por mês, tentamos adiá-la o tanto que pudermos, mas ela sempre chega, fria e sorrateira. Então vem esse cientista afirmando que "esse evento não passa de uma ilusão criada por nossas mentes". E eu, feito Drummond, me pergunto: e agora?

 Sempre deixei minha mente aberta a todo tipo de ideia que possa ter fundamento. Como achei a hipótese dele interessante, ou ao menos plausível, processei os fatos por um tempo e acabei ficando mais confusa ainda. 

Suponhamos que a única certeza que nós tínhamos - a de morrer - agora caiu por terra. Foi invenção. Me contaram isso desde o dia em que nasci e eu acreditei. Mas é duvidoso. A morte pode não existir. Se essa certeza antes inabalável agora não é certa o que posso eu saber realmente? Nada. No momento em que a base, a mais sólida das coisas, balança, tudo despenca. Todo o trabalho de séculos feito pelo homem está estilhaçado. O homem, esse ser que inventou a lâmpada, o carro e o computador, é o mesmo homem que disse que o momento em que o coração para de bater e o cérebro de trabalhar é chamado "morte" e deve ser temido e todos acreditaram. Mas não! Não sei mais se a porta é porta, se o mundo é mundo, se eu sou eu. E se eu não posso mais saber se eu sou eu, Robert Lanza, autor de toda essa problemática que toma conta da minha cabeça, não tem como saber se é mesmo Robert Lanza. E, não sabendo, não pode dizer que a morte é produto das nossas mentes, porque, fazendo isso, ele também se torna um produto, se torna irreal. Ou seja, agora eu não sei de mais nada!

Essa sensação de ignorância perante o mundo é a mesma que senti ao ler Assim Falava Zaratustra. E detalhe: eu desisti. Quer dizer, dei um tempo. Isso se chama negação. É um mecanismo usado pelo nosso cérebro que nos impede de querer nos matar com perguntas que vão além do concebível pelo nosso limitado imaginário humano e é o que eu estou fazendo agora ao terminar esse texto sem uma resposta definitiva para o título. É o que me faz esquecer todo esse dilema envolvendo a morte e me preocupar com problemas com os quais eu posso lidar. Quem quiser quebrar a cabeça com especulações, à vontade. O mundo está cheio delas. Minha mente, agora, está ocupadíssima tentando se lembrar onde raios eu guardei o cabo do meu celular.
 

domingo, 1 de dezembro de 2013

A carta

 

Quando era adolescente e ideias revolucionárias pairavam sob sua cabeça esperando pousar e criar raízes, ela escreveu uma carta. Escreveu tudo no ímpeto da fúria, traduzindo em palavras todas as suas inquietações para com o mundo e para consigo mesma. Xingou o Seu Nestor, que vivia dando pitaco nas suas andanças; teorizou sobre o porquê das suas tias se importarem tanto com os seus quilos a mais; deu provas conclusivas de que não importava o quanto tentasse, seu desempenho em matemática sempre seria horrível. Era uma carta bem elabora de 15 páginas, escritas à mão com uma caneta preta e guardava nas suas linhas toda a raiva juvenil. Todavia dentre todas as acusações e injúrias, grande parte da carta - quase a metade - era direcionada à sua recém paixonite e analisava todos os pormenores, à la Sherlock Holmes, dos seus três encontros com ela.

O primeiro fora na esquina da rua onde morava. Um observador desatento não o teria notado, mas ela, que sempre andava alerta e à espera de qualquer surpresa inconveniente, viu-o passar por si como um raio e ainda o espreitou pelo canto do olho, quase tropeçando por causa disso. Nos sonhos daquela noite, aquele rosto lhe apareceu e ela acordou intrigada com o seu próprio inconsciente. 

Quando uma mão pesada tocou seu ombro e sua cabeça virou para olhar quem era, não teve dificuldade de se lembrar do garoto que vira outro dia na rua, enrubescendo em seguida ao pensar involuntariamente no sonho que tivera e perguntando-se o que ele pensaria se soubesse. Sentou ao seu lado e contou-lhe que acabara de se mudar para  aquele prédio. "Estou incomodando? Se sim, sento em outro lugar." "Não, imagina."  Uma pergunta difícil permeou a cabeça da garota logo depois que acabou a conversa bem-humorada de quarenta minutos deles: a simpatia era gratuita ou ele estava a flertando? A linha que separava as duas coisas era tênue e ela preferiu não tirar conclusões por ora, esperando por outra oportunidade. 

A outra oportunidade, entretanto, não foi bem como esperava. Quando estava sentada no mesmo banco, ele veio informá-la que, infelizmente, mal chegara ali e já ia se mudar novamente. A avó estava doente e a mãe queria ficar perto dela em tempo integral. "Puxa. Melhoras para a sua avó." "Obrigado." A conversa daquela vez foi mais rápida e constrangedora, como se os dois estivessem se perguntando internamente se deveriam ficar tristes pela separação ou se não houvera tempo para isso. 

Foi uma semana triste para ela, que rememorou os encontros várias e vária vezes, praguejando o destino por ter sido tão mau e impedido que ele se encantasse por ela tanto quanto ela se encantou por ele. Ficou imaginando o que poderia ter acontecido se ele não tivesse ido e isso a acalentou antes de dormir diversas noites. Descobriu-se apaixonada depois da sua ida e sabia que isso era horrível, porque era uma ida sem volta. As chances de reencontro eram ínfimas. 

Então escreveu aquelas 15 iradas páginas. Começou relatando os infortúnios de gostar de alguém que nunca voltará e depois, como se a chuvinha fraca tivesse virado tempestade, esbravejou acerca de todas as injustiças que acometiam o mundo. Escreveu como se não houvesse amanhã, como se aquelas palavras estivessem engasgadas há muito tempo, como se aquela carta fosse a carta que mudaria o mundo. 

Envergonhada após de ler tudo que com tanto afinco defendera, queimara o trabalho de tantas horas achando-se a garota mais idiota do mundo. Ela ainda lembra, apesar de tantos anos, do cheiro de papel queimado que ficou impregnado nos seus cabelos. Lembra-se mais nitidamente, como se fosse ontem, das batidas pesadas na porta da sala. Sabia que a mãe iria sentir aquele cheiro e iria perguntar o que acontecera. Droga!

Mas não era a mãe.

Era ele.

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Como é viver no mundo contemporâneo

Na quinta-feira da semana passada faltou energia. Era véspera de feriado, a lua estava linda e eu poderia estar feliz por só faltar um pouco mais de uma semana para as férias, mas a única coisa que eu pensava era no tanto de tédio que eu estava sentindo. Deixo aqui registrado o fato de que eu odeio apagões, por motivos simples: tenho medo de que as velas incendeiem minha casa, as baterias do celular e do notebook logo descarregam, não gosto de ficar olhando para o teto. Então eu finalmente (!) me dei conta do quanto sou dependente dessas tecnologias inventadas pelo homem. Se, por algum motivo, todas elas deixassem de existir, não sei se a nossa espécie conseguiria se adaptar novamente à vida sem elas. Eu, por exemplo, seria consumida pelo tédio.

Há cem anos, estar escrevendo num blog, como eu estou fazendo agora, para qualquer pessoa do mundo ler, devia ser o nível mais alto de bruxaria. Hoje, os bebês ainda na barriga da mãe já ganham um perfil no Facebook. Eu acho assustador. Assustador porque não tenho ideia de onde isso vai parar. Temo que nós estejamos nos fechando numa bolhinha que vai tendo cada vez paredes mais grossas. Fico pensando se, um dia, o contato humano será coisa secundária, que aconteça vez ou outra num ano. Quem poderá dizer onde estaremos daqui a cem anos? Cientistas acreditam que casar com robôs, no futuro, seja coisa viável.

Minha mãe me conta histórias da infância dela e todas são tão legais. Ela e os irmãos roubavam as frutas da plantação para fazer bichos, cozinhavam em panelas de barro as sobras do almoço de verdade, conversavam à luz da lua, tomavam banho em riachos e faziam tudo que se possa imaginar que crianças façam com criatividade e companhia. Já eu, eu não tenho tantas coisas bacanas assim para contar e vejo que as crianças de hoje terão menos ainda. Não se pode mais brincar na rua com medo de se levar uma bala perdida qualquer, então o mundo das nossas crianças fica restrito a quatro paredes, a jogos eletrônicos que são, na sua maioria, nada educativos.

Estava eu pensando sobre tudo isso, olhando para o teto, quando a energia voltou e gritos ecoaram por toda rua numa felicidade só. Também não achei ruim. Acho que vivemos de uma forma tão incrivelmente diferente da dos nossos antepassados que não dá para voltar atrás, agora é só seguir adiante. Embora seguir adiante possa não ser a melhor escolha.

domingo, 3 de novembro de 2013

Por que eu não preciso de aventuras

Um dia desses (pausa no texto para lembrar do dia porque quando a idade chega não tem como se salvar), quer dizer, na quarta, no curso de inglês, estávamos falando de mudanças e chega até ser engraçado falar disso na minha frente, porque na minha vida só ocorre uma mudança anual: a de anos vividos. Dizendo isso, não com essas palavras, ao professor, para justificar que não, não era porque eu não queria falar, era só porque não existe mesmo o que falar, ele começou com o conselho que eu já recebi inúmeras vezes na vida: get yourself a life. A única que não me manda sair, me divertir, curtir a vida enquanto sou jovem e tenho tempo é minha mãe. Excetuando-a, todos me olham embasbacados quando descobrem que minha vida se passa em casa, assistindo a uma boa série e lendo um bom livro. Só porque: o melhor lugar do mundo é a minha casa.

Disseram logo lá no curso: ela vai escrever sobre isso no blog. Vou mesmo. Não é comum que eu vire tópico de conversação durante tanto tempo assim, como foi na quarta, quando o professor embalado por tentar me fazer sair e ter finalmente (finalmente!) algo para compartilhar com eles contou algumas de suas aventuras como a pessoa louca que ele é. E eu descobrir algo, inclusive: adoro aventuras, mas as dos outros.

Não me imagino, sinceramente, saindo sem rumo por aí, sem dinheiro, sem comida, sem um roteiro na mão querendo viver uma aventura. Provavelmente eu cairia no choro e daria adeus ao mundo, à família, ao blog, porque voltar viva para casa, com toda essa minha inexistente coragem, seria um milagre. Não gosto nem de confusões, porque meu coração acelera e eu penso que alguém vai sacar uma arma, atirar e o tiro vai me matar lentamente porque a ambulância não chegará a tempo devido o congestionamento, quiçá viver horas e horas à base de adrenalina. Ou seja, vida de aventura: não para mim, thanks.

Entretanto, ninguém nunca poderá dizer que eu não vivi uma aventura sequer na minha vida. Vivi muitas, mas alheias. Cada livro é uma aventura. Cada filme é uma aventura. Conversas travadas também podem ser aventuras. E, veja só que delícia: eu não preciso sair de casa para viver essas. Elas são até um pouco minhas, afinal. Não reclamo nem nada, já que sou assim e certamente assim serei até o meu último suspiro. Prefiro a minha casa a festas. Prefiro sair com quem é meu amigo há muito tempo a tentar arranjar outros novos. Prefiro uma vida calma a aventuras. Se isso é incomum aos dezesseis anos, o problema não é meu. Aliás, o problema não é de ninguém porque problemas não precisam de donos. Cada um é do jeito que é. Eu não vou mudar para me enturmar e ser socialmente aceita porque, para mim, a felicidade está aqui mesmo, na exclusão, no ser "diferente". Acho muito legal quem tem esse espírito aventureiro e sai por aí sem medo de nada, passaria horas e horas ouvindo histórias vividas por gente assim, mas sou diferente. E vou continuar sem coisas para contar nas aulas de inglês. Sorry, teacher.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

A vida é um esboço

Estou lendo A insustentável leveza do ser, do Milan Kundera, e página vai, página vem, deparei-me com uma reflexão sobre a vida que eu sempre tive dentro de mim. Rolou uma identificação tão grande que fiquei espantada. Sabe como é quando palavras - que não são suas - sintetizam exatamente aquilo que você pensa? É estranho, porque comprova algo que, se refletido, assusta: a universalidade das sensações. Você lê assim, como quem não quer nada, lê novamente e atesta: opa, mas eu já pensei isso antes! Eu poderia transcrever o que o autor diz, mas preferi explicar isso à minha maneira, já que a problemática é minha grande conhecida.

Sempre percebi que para dar adjetivos a qualquer coisa que seja, é necessário uma referência. Levemos em consideração uma situação hipotética: você me diz que sua amiga, Ana, é legal. Mas a Ana é legal com relação a quem? Comparada com Maria, ela é extremamente gente boa. Por outro lado, comparada com Joana, uma das pessoas mais bacanas da face da Terra, a Ana é um porre. O ato de ser legal ou não depende. E todas as outras coisas dependem também. Depende do que eu levo em consideração. Se você aponta o dedo para alguém e diz que aquela pessoa é alta, é porque ela é alta em comparação ao padrão de alto que temos dentro da nossa sociedade, mas comparada a Robert Wadlow, um dos homens mais altos do mundo, por exemplo, ela é uma nanica. Veem onde eu quero chegar?

A discussão que propunha o livro seguia a mesma linha de raciocínio. Temos a nossa única, linda e adorada vida, mas a parte deprimente é que nunca saberemos se estamos indo no caminho certo ou no errado com relação a ela, simplesmente porque não temos outras vidas com as quais comparar. Quando temos uma decisão muito importante para tomar e optamos por A em detrimento de B, nunca saberemos se B seria o melhor para nós: não temos como voltar atrás e escolher B para saber como seria. Por isso que a vida é um esboço, o esboço de uma obra que nunca será feita. É como se estivéssemos sempre tendo que escolher entre o agora ou o nunca, como se estivéssemos improvisando uma novela que nunca vai ao ar e que, por isso, não nos promete um final feliz. 

 Me identifiquei tanto com essa passagem do livro porque sempre fico me perguntando o que estou fazendo da minha vida. Sempre planejando minuciosamente o meu futuro, as minhas ações. Não quero chegar na velhice insatisfeita com o que quer que seja, remoendo o passado, pensando em outros rumos que minha vida poderia ter tomado. Quero simplesmente estar feliz e completa com a trajetória que eu fiz. Na verdade, não acho que é de todo ruim isso de se ter uma única oportunidade na vida para tudo. O acaso nasce daí, e não posso me esquecer que sou fruto do acaso. Não só porque nasci sem planejamento, mas por tudo que já experimentei da vida. Todos somos um acaso. Somos assim por causa daquele filme que estava passando e decidimos assistir só para passar o tempo, por causa daquele livro que nos deram inesperadamente de presente, por causa daquela pessoa que, por acaso (veja bem), virou nossa amiga. 

Realmente, apesar de deveras inconveniente, uma vida sem acasos seria uma vida chata. A vida sabe o que fazer conosco sem precisarmos saber o que fazer com a vida. Só é preciso torcer para fazer dela o melhor esboço possível e, claro, esperar que o acaso dê sua mãozinha de sempre.


sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Sejamos bonitos

São vários os motivos pelos quais, hoje, eu me recuso a apontar o dedo e julgar uma pessoa bonita ou feia sem conhecê-la bem. Pode parecer coisa de gente chata (talvez seja, enfim...), mas eu levo muito mais pontos em consideração do que os que são possíveis de se notar apenas olhando para o físico de alguém. Na verdade, aparências não me dizem porcaria alguma. E mais: não entendo as convenções do feio, porque pela lógica os elementos peso/altura/cor/cabelo são apenas características secundárias e pouco importantes quando comparadas com palavras, maneiras e ações. Não sei desde quando o ser magro-alto-com-cabelo-e-olhos-claros se tornou o almejado e todo o resto, indesejável; o que sei é que vivo numa luta interna para combater esses princípios incutidos em mim pela sociedade e busco levar outras pessoas comigo nessa longa e difícil aceitação.

Por isso, não me pergunte se eu conheço alguém feio, porque a resposta será não. Todas as pessoas de que gosto são bonitas, mas não gosto delas por serem bonitas, elas se tornam bonitas aos meus olhos por eu gostar delas. Baseando-se nisso, chega-se à conclusão de que não há ninguém feio nesse mundo, simplesmente porque o feio não existe. O feio é invenção. Existem, sim, pessoas moralmente horríveis, com atitudes pouco encantadoras, mas até elas já foram ou são bonitas para alguém, nem que seja para elas mesmas. Então, quem sou eu para dizer que a moça da TV é feia porque está acima do peso? 

O feio só está dentro de nós. No dia em que nos propusermos a abraçar o mundo com todas as forças, esquecendo todas as diferenças entre nós e o outro, veremos que todos somos pessoas lindas. Mas só seremos assim se nós nos fizermos lindas. Só se acordarmos todos os dias e pararmos de nos maldizer diante o espelho. Respirando fundo e entendendo que temos as opções "a) passar a vida nos odiando por ser assim e não assado" "b) aprender a conviver com o que se é, porque não dá para ser outra coisa" e escolhendo a "b" como alternativa de vida, olharemos ao espelho e perceberemos que o reflexo mudou. Não é um processo fácil, porque parece que nesse mundo nos ensinam de tudo, menos a nos gostar, mas esse é aquele tipo de coisa tão importante que é necessário que se morra tentando, se for o caso. 

Então, no meu tempo limitado de vida, me comprometo a fazer de mim alguém bonita, especialmente para mim mesma. Sim, gosto do que me tornei depois de crescida, era meio que exatamente o que eu desejava. Gosto do jeito que consigo captar as coisas facilmente no ar, o dito e o não-dito, às vezes até pensamento. Gosto de ser interessada por ciência e ser curiosa ao extremo. Gosto de gostar de livros. Gosto do meu raciocínio rápido, da minha mania de fazer as coisas do jeito correto e da minha infantilidade. E antes que venham me acusar da minha falta de modéstia, alerto: isso é só amor-próprio. Mas é que ter amor-próprio é tão raro nos dias atuais que qualquer sentença que dê a entender que eu gosto de mim beira o convencimento. Além de tudo, logicamente existem infinitas coisas que desgosto, como a minha falta de tato com as pessoas e meu pessimismo exacerbado. O desafio está justamente em conviver com tais coisas, aprender a gostar delas também como parte integrante do meu eu. 

Já posso sentir o gostinho do dia em que serei totalmente independente de opiniões alheias, o dia em que não levarei em conta coisas más dirigidas a mim, porque eu não precisarei do julgamento de ninguém. Não precisarei de ninguém para me elogiar e me dizer o que já sei: sou linda. Não no sentido literal dado à palavra atualmente, mas num aspecto mais amplo, geral, relevante: sou linda por explorar todas as minhas potencialidades, por me mostrar como sou, por não querer me mudar e ser feliz assim, por dar a cara à tapa, por lutar pelo que eu acho certo, por olhar no espelho e não enxergar um monte de defeitos, mas sim ver alguém especial e que faz diferença no mundo. Esse dia chegará. Basta cruzar os dedos, torcendo para que não demore muito, e fazer algo bem simples: se gostar. Hoje. Amanhã. Sempre.
 
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sábado, 28 de setembro de 2013

Finitude

Às vezes eu me sinto muito triste ao lembrar que os meus dias de vida são finitos. Eu poderia ter aproveitado de uma maneira muito melhor o tempo que eu já tive, mas ele já foi e não tem volta ou segunda chance. Se hoje fosse meu último dia, o que eu teria para o mundo? Bem, seu mundo: eu pretendia ter plantado uma árvore ou escrito um livro, mas como nada disso foi possível, eu só espero que o meu tempo empregado aconselhando os que estavam ao meu redor tenha sido útil e que eles plantem árvores e escrevam livros e povoem essa Terra por mim, já que eu acho que o lixo que eu guardei na bolsa para não poluir a rua foi tão ínfimo que na verdade não contribuiu com nada, não.

Um caminho. Só seguimos um caminho nas nossas vidas. Dentre infinitas outras coisas que eu poderia estar fazendo para ocupar meu tempo nesse sábado, eu escolhi escrever. E essas escolhas é que são capciosas, nunca poderemos saber se escolhemos o certo ou o errado pro futuro.

Eu não sei o que fazer da minha única vida e tenho medo de acabar não fazendo nada. Eu queria saber como é ser cosmóloga, porque o Universo me intriga e, com sorte, eu poderia desvendá-lo. Mas eu também queria ser filósofa, só para um dia entender e falar com propriedade sobre as ideias de quem entendia o mundo com olhos diferentes dos meus. Eu queria morar na França, em Londres, passar férias na Austrália e o Natal na Finlândia. Queria ter coragem de tatuar versos do Neruda ou saltar de paraquedas. Queria experimentar dias como bióloga, e depois como arqueóloga, ser atriz de teatro e quem sabe trabalhar numa livraria? Queria ser babá, jornalista, aprender a jogar qualquer tipo de coisa que envolva uma bola e dar palestras sem gaguejar. 

Só uma coisa me impede de fazer tudo isso e mais: o tempo. Porque, por mais que eu planeje cada segundo do meu tempo, não vai dá para fazer tudo que eu queria fazer. Por mais que eu viva lendo sobre experiências alheias, a sensação de viver aquilo eu nunca terei. Tenho que me contentar com as minhas escolhas e viver feliz com elas, acariciando o pensamento de que fiz o melhor. Porque, mesmo que você tenha vivido tudo que esteve ao seu alcance, você não viveu tudo que pôde. A morte sempre vai chegar e deixar em aberto algum dos seus planos.

domingo, 15 de setembro de 2013

E daí que Gabriel García Márquez entrou na minha vida

Não há sensação melhor do que estar à toa olhando os livros da estante da biblioteca da escola, e ver, lá no topo, bem apagadinho, velho e aparentemente sem graça o livro que era exatamente aquele que você queria, mesmo sem nem estar procurando por ele. E foi melhor ainda porque você teve que devolver o mesmo há pouco tempo, pois ele era emprestado e o prazo ia acabar sem que você tivesse a mínima possibilidade de ler por estar cheia de coisas para fazer. Sabe o que é largar o seu livro preferido da vida no terceiro capítulo? Sabe o que é saber que aquele livro será o seu preferido desde a primeira página? Sabe o que é ter que devolver seu livro preferido sem lê-lo e depois, num estouro de alegria, encontrá-lo gritando seu nome enquanto quase salta da estante para se aconchegar nos seus braços?

Foi exatamente essa relação que tivemos eu e Cem Anos de Solidão, do Gabriel García Márquez. Já tinha ouvido falar muito do livro, mas só por alto, e comecei a lê-lo sem saber nada sobre a história. Foi amor à primeira linha, acreditem. Não sei explicar o que sucedeu, só sei que eu não queria fazer mais nada da vida além de ler, ler e ler... Ler até o mundo acabar e só ler, simplesmente porque o livro é incrível, é diferente de tudo que eu já li na vida e o autor é um gênio.

Como eu disse, tinha pego o livro emprestado, mas tive de devolvê-lo porque eu odeio não entregar as coisas no prazo, e também porque eu só estaria livre para ler depois de umas duas semanas, uma vez que mal tive tempo de respirar entre o tempo decorrido entre feira de ciências e provas. Já estava amolando minha mãe a um tempão para me comprar esse livro até o momento incrível já descrito: achei-o na biblioteca da escola. E eu já conheço aquilo ali de cabo a rabo, não sei como não vi esse livro lá antes, por isso que eu repito: ele gritou por mim, é recíproco.

O livro é bem confuso, isso é tão verdade que eu acabei de lê-lo ontem e não sei mais quem é filho de quem. Existem muitos Aurelianos e Josés Arcadios na história, sabe? Sempre que nascia um menino o nome era um desses, e quando nasciam gêmeos os dois se chamavam assim. Daí que eu esquecia quem era quem vez ou outra, mas isso de jeito algum deixou a leitura menos gostosa. Cem Anos de Solidão fala sobre a estirpe dos Buendía, a história dessa família durante cem anos. Começa com Úrsula e seu marido, José Arcadio Buendía, vivendo na recém-fundada cidade de Macondo, um simples agrupamento de pessoas que viviam sem qualquer tipo de tecnologia, viviam da forma mais primitiva possível. No decorrer do tempo, vemos os seus filhos nascerem e seguirem seus caminhos,  vemos seus netos, bisnetos e tataranetos fazerem o mesmo. Vemos a cidade evoluir e ganhar um trem. É o simples relato de vidas, de momentos, mas, ao mesmo tempo, é uma complicada reflexão sobre muitas coisas, principalmente sobre solidão.

Acho que esse é o primeiro livro de realismo fantástico que eu leio. Se eu li outro, não lembro. Mas o que eu entendi desse gênero é que é normal acontecerem coisas do tipo panelas flutuarem, ou pessoas que não dormem durante meses, ou gente que come terra, ou um homem que atrai borboletas e afins. Não sei se é uma característica de todos os livros que são assim, porém esse, em especial, é muito engraçado. A leitura é muito divertida e a melhor hora do meu dia era quando eu pegava esse livro para ler. Não consigo descrever o quão perfeito ele é e nem o quanto eu adorei o final.

Pretendo ler toda a obra do Gabriel García Márquez para ontem. É necessidade. Já dei umas fuçadas por aí e vi que ele tem vários livros, que acredito que sejam tão bons quanto esse. Na verdade, eu queria me chamar Gabriel Garcia Márquez para sair perguntando às pessoas se elas já leram Cem Anos de Solidão. Se elas dissessem sim, eu encheria o peito de orgulho e declararia "eu que escrevi!".



sábado, 7 de setembro de 2013

Quando eu me chamava Mia

Rebelde

Já havia tido a experiência de sentir uma nostalgia gostosa quando vi num desses sites da vida uma lista com vídeoclipes que lembravam infância, e lá estava: Rebelde. E mais: eu lembrava das músicas. Sim, porque aos oito anos eu gostava muitíssimo de Rebelde, de uma maneira que eu nem consigo explicar. Fiquei sabendo não sei quando nem onde que a novela mexicana iria reprisar no SBT, uma coisa que eu sempre quis que acontecesse. Só ontem tive tempo de sentar a bunda no sofá e relembrar a infância, a época em que eu era a Mia e a Mia era eu, mesmo minhas primas querendo que eu fosse a Roberta (pelo cabelo) e eu me parecendo muito mais com a Lupita, pelo jeito retraído.

Não lembro da história porque não assistia aos capítulos regularmente, mas lembro de ter chorado um choro sincero quando a novela acabou, porque era realmente o fim. Lembrando que, apesar da pessoa que vos fala não ser velha, naquela época eu não tinha computador, nem celular, nem coisa que o valha. Fui esquecendo aos poucos até superar por completo. Rebelde passou, mas mesmo assim é impossível não sentir falta de quando eu tinha um metro de altura e queria um uniforme com gravata daqueles para mim.

Meu nível de fanatismo pelas coisas sempre foi alto. As pessoas gostam, mas eu gosto demais (minha mãe que o diga). Comprei DVDs, CDs, bonés, camisetas e a primeira bota da minha vida é dessa época. Tenho até hoje revista, álbum, foto, adesivo que vinha no chiclete, bolsa, anel e fui pega de surpresa ao perceber que eu ainda sei cantar a música de abertura. Tinha a data de nascimento dos 6 decorada, assim como os nomes completos. Pedi, uma vez, para minha professora de inglês traduzir umas palavras que não eu entendia na letra das músicas, porque para mim, naquela época, quem falava inglês falava espanhol também. Cheguei ao extremo de convidar membros da família para assistir a um show onde eu e as minhas duas primas - que eram loucas igual a mim - dançávamos a coreografia de umas músicas, decorada de tanto assistir ao mesmo DVD. Mas nada supera o fato de eu ter convidado um garoto, por meio de uma carta, para ser a minha dupla numa banda que eu queria formar. Ele nunca respondeu, e eu sou grata por isso.

E tudo voltou com essa reprise. Claro que não vou assistir novamente à novela, não tenho tempo e nem mais saco para os ataques histéricos da Mia, as rebeldias da Roberta e a perfeição surreal do Miguel (por falar nele, como eu amava o Miguel!), mas é muito bom relembrar tempos que não voltam, porque a gente esquece tão fácil que precisa de uma novela para lembrar o quanto era feliz aos oito anos e como vivia dizendo à prima mais nova quando ela fazia birra que tudo na vida é só perder ou ganhar, então ela teria que perder alguma vez também. Mas aí me diziam o mesmo e eu não gostava. Eu tinha oito anos, poxa. Mereço um desconto.

domingo, 25 de agosto de 2013

No sábado em que me senti importante

Sempre cresci com a certeza de que político não presta. Que votar é perda de tempo. Que é um absurdo sermos obrigados a isso. Que se não fosse obrigatório, quase ninguém ia. Que prometem, mas cumprir que é bom... nada! Que os candidatos são uns amores em época de eleição, distribuindo sorrisos aqui, apertos de mão (e quem sabe uns cinquenta reais disfarçadamente) acolá. Por isso nunca me importei muito com política, pus na cabeça que só ia votar quando fosse obrigatório mesmo, depois dos 18, e todo mundo me apoiava. Porque é horrível ter de perder várias horas da sua vida numa fila imensa para votar em alguém que não dá a mínima para você. Pensava assim mesmo, juro. 

E foi por isso que minha mãe achou estranho quando eu disse que queria fazer meu título, mesmo só tendo meus 16. Tenho mesmo essa extrema facilidade de mudar de opinião. E isso é bom, certo? Ela tinha que fazer o tal do recadastramento biométrico, que custava me levar junto, então? E daí nós fomos: eu, ela, minhas duas tias e os meus dois primos. Porque programas assim também podem se fazer em família.

Uma fila imensa nos esperava. 

Nunca vi cristão mais apressado que brasileiro. Talvez seja porque eu nunca saí do país. De qualquer maneira, tinha muita gente reclamando lá e só um pobre homem tentando acalmar os ânimos gerais. Tudo bem que estava fazendo um sol dos diabos, mas o que são vinte minutos de espera numa fila? O que é uma hora de espera comparada ao tempo que você já viveu, ao tempo que você perdeu assistindo, sei lá, um jogo de futebol, ou fazendo qualquer outra coisa inútil? Mas é claro que brasileiro tem que reclamar. Ô moço, como você pode deixar a mulher passar? Ela chegou atrasada. As três horas já passaram, já são três e cinco! Isso é um desrespeito! Queria que as pessoas dedicassem tanta atenção a coisas mais importantes que, só pra variar, não estivessem relacionadas a elas mesmas. Tem noção da quantidade de gente espalhada pelo mundo passando fome numa hora dessas? Num século desses?

Não gosto de quem me chama de senhora. Eu não sou uma senhora. Mas o homem que me atendeu me chamou de senhora umas vinte vezes. O nome da senhora, por favor. Os nome dos pais da senhora, faça o obséquio. Onde a senhora deseja votar? Poxa. Eu entendo perfeitamente que o homem estava sendo educado, e não é que eu odeie quem me chama assim - até porque eu não odeio ninguém -, é só que quando me chamam assim eu me sinto extremamente velha. E eu não gosto. Não gosto quando chamam as pessoas de um nome que não é delas. Não gostaria que chamassem a laranja de banana, por exemplo. Acho que já deu para entender. Claro que fiquei calada. Deixei ele me chamar de senhora à vontade. Até porque o trabalho que ele fazia é muito chato. Ficar explicando os mesmos termos todo dia a pessoas diferentes deve ser muito chato. Ele merece um desconto.

"A senhora pode me emprestar seu título um minutinho?" "Não tenho título, não. Eu quero fazer um."  Foi a primeira coisa que dissemos, eu e o homem que me chamava de senhora. E naquele momento eu quis explicar as razões que fizeram eu me deslocar da minha casa até lá, mesmo com a imensidão de coisas para fazer e com o Cem Anos de Solidão para ler. Primeiramente, diria eu ao moço, eu preferiria ser chamada de senhorita. Depois que você deve estar se perguntando o que uma pessoa tão jovem veio fazer aqui. Ou então nem esteja, porque você me perguntou se eu era casada e talvez não me ache jovem. Mas eu queria dizer que não acompanhei a luta das mulheres pelo direito ao voto. Não sei onde ficam as pessoas quando ainda não nasceram, mas eu estava lá. Só sei que foi uma conquista e tanto. Teria até chorado se fosse viva. As mulheres estavam saindo às ruas e não era para levar filho à escola, nem para levar marmita ao marido: era para votar. Era para finalmente ser cidadã de uma sociedade que a excluiu durante milhares de anos. Durantes milhares de anos elas foram subjugadas e obrigadas a viver em função do marido, que era o chefe da família, que possuía a última palavra. Agora, elas estavam votando. E isso foi um grande passo que, inclusive, começou aqui no Rio Grande do Norte e só depois em todo o resto do país. E me dá uma aflição tremenda ao pensar em quantas mulheres tão inteligentes quanto Newton ou Einsten morreram sem saber disso porque nunca puderam exercer sua capacidade mental. Eu não vejo outa maneira, além dessa, de retribuir àqueles que lutaram para que eu, mulher, tivesse esse direito garantido hoje. Por isso vou votar da maneira mais conscientemente possível que puder. Vou votar por todas aquelas que não puderam. Até que teria dado tempo dizer isso ao homem, se eu quisesse. Ele passou uns dez minutos tentando descobrir como se fazia para criar um título de eleitor, aí no fim descobriu que era só pôr minha data de nascimento lá e pronto. Mas não sou de ficar batendo bapo com gente estranha. 

Perdi uma tarde inteira e talvez nem consiga terminar de ler Cem Anos de Solidão antes da data carimbada para devolução, mas quem se importa? Eu sou importante, sou eleitora.

sábado, 17 de agosto de 2013

Os cheiros da minha vida


Tenho uma prima com 12 anos que está usando, coincidentemente, o mesmo perfume que eu usava quando tinha 12 anos. E, ao sentir aquele cheiro adocicado, lembrei-me daquela época da minha vida como se ela tivesse acontecido ontem. 
Eu tenho muito a mania, ou melhor, a "habilidade" de relacionar cheiros a momentos. Foi só ver ela passando aquele perfume de vidrinho azul que eu lembrei do sétimo ano, das milhares de fotos que eu e minhas amigas batíamos naquela época e do meu gosto musical terrível. Não sei explicar como, nem sei se isso acontece com outras pessoas, mas aquele perfume tem cheiro de sétimo ano, tem cheiro de 2009. Assim como um antigo perfume que eu usava que tinha a Emília, do Sítio do Picapau Amarelo, estampada no frasco de plástico me lembra da minha infância e das várias coisas que aconteceram nela. Joguei um frasco desses há pouco tempo fora, ainda com perfume dentro, vencido sabe-se lá há quantos séculos. De qualquer maneira, não resisti e tive que abrir a tampa e sentir o cheiro da minha infância ali dentro. E fiquei feliz em constatar que, depois de tanto tempo, eu ainda o reconhecia perfeitamente.
E eu nem me importo com isso de perfumes. Não entendo também, nem dos nomes eu sei. Não conheço essências porque, para mim, perfumes só têm cheiro de etapas da minha vida. Geralmente quem os compra para mim é a minha mãe. Se gostar, eu uso. É bastante normal eu não acabar um perfume. Na verdade, acho que nunca usei um até o fim, porque eu enjoo fácil e quero trocar logo. Daí que o meu guarda-roupa é cheiro de perfumes pela metade. Se eu quero relembrar o ano passado, é só ir lá e passar o perfume de frasco roxinho que eu usei durante boa parte do ano. Vou lembrar do meu ingresso no Ensino Médio e de todas as implicações que isso teve. Assim como posso relembrar outros tempos do meu passado só abrindo facilmente outros frascos.
Eu tinha - ou ainda tenho, não sei ao certo se joguei fora ou não - um perfume muito lindo e cheiroso. Um dos meus preferidos. Devo ter usado ele várias vezes, mas me lembro de algumas em especial. Usei ele na minha formatura, então ele tem cheiro de uma Luana com sete anos. E também eu o usei num dos aniversários mais legais da minha vida. Tinha de tudo naquela festa. Desde pula-pulas, onde eu me esbaldei de pular, até fogões de mentira para você cozinhar comidas de mentira. E tinha salão de beleza de mentira. Eu devia ter uns seis anos naquela época, mas eu me lembro dela. E me lembro mais ainda quando sinto o cheiro do perfume que eu usava...
Perfumes também me lembram pessoas. Eu costumo prestar atenção, mais involuntariamente que voluntariamente, nos perfumes que as pessoas mais próximas a mim usam. E quando eu sinto aquele cheiro na rua, procuro logo pelo alguém. Mas sempre acontece de ser outra pessoa, e não a que eu procurava. É incrível como tem tanta gente usando o mesmo perfume por aí.
Eu tenho um perfume bem fraquinho, que eu acho delicioso, que só uso em casa. Quando sinto ele em alguém, eu me lembro da minha casa. Lembro que poderia estar na minha cama, quentinha, tendo um livro como companhia. Quando alguém passa repelente, principalmente um infantil que é verde (sim, eu sou péssima com nomes), eu sou transportada à casa em que eu vivi até os nove anos. Toda santa noite eu passava repelente para dormir. Eu posso estar estudando para a prova mais difícil de todas, posso estar tendo a conversa mais agradável de todas, contudo, ao sentir o cheiro, minha mente me levará contra a minha vontade até aquela casa de portão marrom. 
Vai saber se a minha capacidade olfativa é diferente das demais, só sei que cheiro para mim não é só cheiro. Cada um que eu sinto tem um significado que guardo num lugar especial do cérebro. Quem sabe um dia eu compre todos dos perfumes que já usei na vida só para relembrar certa época vez ou outra. Nostalgias são deliciosas.

domingo, 11 de agosto de 2013

Pior comentário

Sinceramente, às vezes eu queria poder abrir meu cérebro e doar um pouco de bom senso a quem não tem nenhum. Eu sou uma pessoa bem calma, mas se você quer me irritar, me mostre um comercial de cerveja. Ou, pior, aja como os idiotas dos comerciais de cerveja. Porque eu não vejo por qual motivo - e acho que vou continuar sem entender pelo resto da vida - os homens têm de reafirmar a sua heterossexualidade a cada segundo. Meu amigo, eu não quero saber se você gosta de homens, mulheres ou plantas. Conviva com o fato.
Então daí, para mostrar que é um "macho alfa", que é homem "de verdade", esses seres encharcados de testosterona se veem no direito de falar as coisas mais horríveis possíveis para uma mulher que passa na rua. Acham-se no direito de incomodá-la, de observá-la descaradamente, de passar a mão e, nos casos mais extremos, de estuprar. Só para mostrar que, vejam só!, gostam de mulheres. Talvez eles estejam tentando convencer mais a si mesmos do que aos outros, mas, de qualquer maneira, eu fico me perguntando se eles não notam, se não têm a mais remota ideia de que isso é terrivelmente errado. Aprendemos desde cedo que a nossa liberdade termina aonde começa a do outro. 
Me deu uma ânsia de vômito enorme quando, hoje, eu li um dos piores comentários que poderia ler numa rede social qualquer. Era um homem convidando seu amigo para ir à praia desfrutarem da vista de mulheres (pausa para eu ir ali vomitar) deliciosas.
E existem tantas coisas erradas nessa frase e nesse homem e nessa vida e nessas pessoas e nesse mundo que me dá desânimo. Primeiro de tudo que mulher não é objeto de contemplação masculino. Ela não é obra-de-arte para a gente ficar apontando os "errinhos" das formas. Depois que deliciosa é o último do último do último adjetivo que se deve usar para descrever uma pessoa, seja ela quem for. Comidas são deliciosas, não pessoas, e isso é óbvio! Assim como outras variações: gostosas, quentes e etc. Não sei se isso é tão difícil assim de perceber, mas mulheres são pessoas. Elas não precisam de elogios nojentos para se sentirem completas ou felizes. Foi-se o tempo em que uma mulher precisava de uma homem para "existir" através de sua figura. Então, eu quero deixar uma singela súplica um singelo aviso:
Homem, nunca dê às mulheres os adjetivos que se dão às comidas. Isso me deixaria eternamente grata. Valorize o sexo feminino. Eu tenho pena de você porque fico imaginando... você tem a mínima noção de quantas mulheres legais deixou de conhecer só porque levou a aparência como primeira e única consideração? Não faça mais isso. E dica: existem vários adjetivos bacanas para se elogiar sinceramente alguém, olha só: você pode chamar a garota de linda, especial, fantástica, meiga, incrível, adorável, esplêndida, interessante, harmoniosa, agradável. É só usar um desses e ser feliz sem ser um imbecil.
Mulher, não se sinta lisonjeada quando assobiarem para você ou te chamarem de deliciosa. Você é uma pessoa e merece ser tratada como uma. Você não é um troféu para ser admirado. Gostoso é o tapa que o ser merece por dizer tais absurdos, porque tapas sim podem ser deliciosos, a pessoa paga para ver? Enquanto isso eu vou estar aqui, no meu lugar de sempre, esperando a humanidade finalmente progredir.

domingo, 4 de agosto de 2013

Sobre o Bento e sua idiotice


Quando eu li Dom Casmurro pela primeira vez, aos 14 anos, achei um porre e não é porque Machado de Assis é Machado de Assis que eu vou negar o acontecido. A leitura me foi enfadonha e eu me arrastei o máximo que pude, porque achei Bentinho um chato e não estava muito interessada na fidelidade de Capitu, pra ser sincera.
Passados dois anos, eu reli o romance e, apesar de continuar achando Bentinho uma das pessoas mais chatas da ficção, li o livro rapidinho e tenho de admitir: o livro pode ser tudo, menos enfadonho. E Machado de Assis é uma das pessoas mais incríveis cuja honra de conhecer nunca terei. Não só por escrever de uma maneira incrível, mas por fazer do leitor seu amigo mais íntimo.
Só que eu não vim falar do Machado, até porque não tenho cacife para tal, mas sim da raiva extrema que me dá a ao menos escutar o nome Bento Santiago. E digo mais: não, ele não amava Capitu. 
Eu já escutei várias vezes que o tema central do livro não é a dúvida se ocorreu ou não a traição, mas esse é o tema central desse post, então, vamos hipoteticamente pensar que a garota o tenha traído mesmo. Vamos fingir que o Escobar lindo e cheiroso a tenha seduzido e ela tenha consentido em manter algumas relações secretas com ele. Não é novidade que eles tenham aprendido a gostar um do outro; devido a tanta convivência, até mesmo Bentinho sentiu-se meio inclinado a pensar em Sancha. Agora, se houve mesmo essa traição, Capitu não esperava que surgisse um filho dela, certamente. Ao milagrosamente num dia acordar e perceber - assim, de uma hora para outra mesmo - que o pequeno era a cara do amigo, Bentinho passar a tratar com ódio e repulsa a mulher e o pequeno Ezequiel.
Ele ao menos tirou satisfação com a esposa, nem a quis mais olhar na cara. Se ela mesmo o traiu, ele sequer quis saber os motivos, perguntar se estava arrependida. O ciúme o fez mais cego que uma porta. O que ele queria, na verdade, era aqueles olhos de ressaca voltados para si e somente para si. Ele não a amava, ele ouviu da boca de terceiros que a amava e acreditou. E eu digo isso baseada num fato: ele não a perdoou.
Quando a gente gosta de alguém, a gente perdoa um monte de coisas. Coisas que nos incomodam nos outros, não incomodam naquela pessoa. E se ela faz algo errado, a gente tenta compreender o porquê daquilo. E depois, se a explicação for convincente, a gente perdoa. Perdoa até vezes demais. 
Mas Bentinho não dá segunda chance a Capitu, acho que todos já conhecem a história. Ele, metido e mimado, castiga-a com sua ausência e indiferença, achando que todas as suas proposições eram verdadeiras e que Capitu já tinha tido sorte demais por ter casado com alguém tão distinto quanto ele. Daí ele vira um casmurro e ela morre esquecida.
Tudo teria sido tão diferente se ele a tivesse amado realmente! Não tivesse só balbuciado essas palavras quando estava encantado com os olhos de cigana oblíqua e dissimulada da outra, mas tivesse provado. Talvez ela nem o tivesse traído e ele teria se sentido um bobo por ter pensado mal da sua amada. 
Mas ele nunca a amou, porque se amar não é perdoar, o que mais poderia ser?

quarta-feira, 24 de julho de 2013

O céu nunca esteve menos azul

always together!

Acredito que, algum tempo atrás, a minha vida já foi mais movimentada. Não tanto a ponto de me tornar alguém popular, mas movimentada o bastante para me dar gosto de acordar de manhã cedo e encarar a água fria do chuveiro levando o sono embora. Talvez o fato de eu olhar a vida com outros olhos, com olhos infantis, contribuíssem a favor. Eu não precisava, como hoje, entender por que diabos o céu é azul, eu o achava lindo e isso era suficiente para levar a vida adiante perfeitamente bem, obrigada.
Mas, agora recentemente, me deu uma de querer os porquês, os comos e os aondes de tudo. E a vida que parecia tão simples de ser vivida tornou-se um emaranhado de teias interligadas difícil de se entender. Enquanto vejo minha vida social se extinguindo por n motivos, como o fato de algumas das minhas amigas terem mudado de escola e a comunicação ter ficado meio difícil e fria, eu converso cada vez mais comigo mesma e não sei se isso é bom ou não. Claro que é muito melhor conversar com alguém do que com você mentalmente, então eu tento mudar essa situação. Afinal, não deve ser tão difícil se enturmar. É só sair por ai sendo quem você é... eu acho.
Na pré-adolescência, para uma garota que sofreu muito bullying na infância, eu até que fazia amigos facilmente. A minha classe tinha muito mais novato que veterano, ou seja, não existiam "grupinhos" formados, estava todo mundo à procura de amigos e, talvez com medo de serem deixadas de lado, as pessoas aceitavam conversar com qualquer outra de bom grado. Foi daí que eu fiz as amigas que eu tenho até hoje e que eu espero ter pro resto da vida.
Só que agora tudo parece mais complicado. Não é só sair por aí sendo quem você é, é muito mais que isso. As relações estão tão banalizadas e estranhas que o que eu chamo de conhecido é, provavelmente, melhor amigo de outra pessoa que tem com o ser o mesmo nível de proximidade que eu. Assim é complicado. Então eu notei que fazer amizades, amizade sem aspas, é dificílimo porque as pessoas não estão mais interessadas nisso.
A questão aqui é: a cada ano que se passa, sinto que a minha vida vai se tornando mais lenta e monótona, como se já fosse regra. E eu juro que não tenho nada a ver com isso. Até onde eu sei, tenho os mesmos hábitos de sempre, as mesmas tentativas falhas de conversa, a preocupação em passar de ano e o blá blá blá que sempre foi meu. Mas hoje em dia, eu vou preferir conservar meu sono bem longe d'água fria às manhãs. 
Não estou reclamando nem nada, porque a mudança ocorreu de maneira tão gradual que nem percebi. Percebo só de vez em quando, como em dias como hoje, quando eu notei o quanto eu senti falta de uma amiga que eu não via há uns bons cinco meses e fiquei lembrando das coisas que nós passamos juntas. Alegrias que provavelmente mal se repetirão, porque tomamos rumos diferentes de vida, que só vão se cruzar assim, vez ou outra, de ano em ano. E é por causa de perdas desse tipo que foram me ocorrendo ao longo da vida que o céu nem parece mais que tem um azul tão bonito. Estou presenciando amizades que demoraram tanto tempo para se consolidar serem demolidas pelo sopro do vento e a angústia da distância rapidamente, e o que mais dói é saber que o buraco nunca vai ser preenchido.

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foi o que eu sempre pensei...

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Sobre comédias românticas

Eu entendo que não há nada melhor que uma comédia romântica para passar o tempo, esquecer da vida, mergulhar em histórias de mocinhos e mocinhas que se amam ardentemente. O problema é que, quando se assiste a esse gênero demais (como eu fiz nas recentes férias), você percebe que comédias românticas são todas iguais. 
A história é o seguinte, basicamente: existem os já citados mocinho e mocinha e ambos se apaixonam, sendo que o amor deles tem algum impedimento: ou eles pertencem a classe sociais diferentes; ou a mocinha se acha feia/gorda demais para ele, porque não existem amor próprio nessas garotas, é incrível; ou os pais não aprovam; ou, sei lá, eles não têm coragem de admitir que estão a fim e pronto. Daí o filme todo se baseia nos conflitos internos (e até externos, em alguns casos) desses protagonistas e tchan!, eles terminam juntos, felizes e tudo parece perfeito, a vida parece perfeita, o brócolis parece mais saboroso, a dor no pé nem incomoda mais, porque eles terminam juntos e provam que é possível que existam hoje em dia caras lindos e fofos que, ao invés de querer dar só uns pegas, vão contra tudo e todos, vão contra o universo se possível, para consumar esse amor, e garotas que conseguem arranjar alguém mesmo se maldizendo o tempo inteiro ("oh!, Fulano, eu não te mereço!"), já que não existe nada mais grandioso e importante do que o amor que se sente...  Não, espera, tem algo errado aí.
E é nesse ponto que as comédias românticas fazem mal. Mesmo sendo provavelmente meu tipo preferido de filme, eu vejo sérios problemas nele. Ele aliena a cabeça de certas garotas, que passam a vida esperando por seu príncipe, ou, em casos piores, ficam esperando descobrir que são princesas de algum lugar, como a Mia, e que vão sofrer uma mudança drástica de visual que as transformarão em verdadeiras beldades. Tá errado, gente.
O que se sucede é: não, provavelmente sua vida não será digna de nenhum roteiro de filme. É bem difícil que o garoto mais popular da sua escola se descubra repentinamente apaixonado por você sem que você faça nada, e ainda é mais improvável que ele apareça na sua janela com uma serenata improvisada, ou que se mate por você, à la Romeu. Sendo que esse último caso é doentio, acredite. Mas isso não quer dizer que o rapaz não goste de você. É só que ele não é nenhum personagem de filme hollywoodiano.
Daí eu fico imaginando os relacionamentos: garotas querendo uma declaração de amor igual a que encerra Pretty Woman e recebendo um serenata de amor. Tenho um sincero conselho: fique feliz com o serenata de amor, porque você o está recebendo de uma pessoa real. E fique feliz se, por acaso, receber uma declaração feita a de filmes. Ou seja, fique feliz com quaisquer que forem os momentos singulares que acontecerem realmente na sua vida. Não existem príncipes encantados ou princesas por aí, mas tem muita gente legal esperando ser conhecida e preenchida. Dê uma chance, vale a pena.

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terça-feira, 16 de julho de 2013

Leve reflexão sobre se estar crescendo

Hoje eu me peguei muito surpreendida com uma coisa. 
Eu sou boba mesmo e sempre tive coisas como "rituais" para primeiros dias de aula. Era de praxe ficar nervosíssima sem motivo algum. Sério. Ficava tão nervosa como em dia de prova. Mesmo sabendo que todos ali já me conhecem, que a minha chegada não vai ser motivo de festa alguma, que pouquíssima gente até nota minha presença, eu entrava na escola com o pé direito, sim, senhor. É como no Natal: tem de ter roupa nova, nem que ela tenha custado 5 reais, porque é Natal e eu gosto de usar algo pela primeira vez no Natal. E assim corria minha vida, eu e minhas manias andando juntinhas de mãos dadas.
Até ontem.
Porque ontem, andei pensando nisso só hoje, foi um dia estranho. Acordei no automático para volta às aulas depois do recesso e só hoje, depois do segundo dia, que eu vim notar que ontem foi o meu primeiro e eu nem fiz ritual algum. Sequer atentei para aquilo. Nem entrei com o pé direito. E, pasmem: não fiquei nervosa.
É definitivamente desconcertante.
Não sei se isso é efeito colateral de alguma doença, porque eu sou uma pessoa paranoica que acha que qualquer coisa estranha é sintoma de doença, ou se é só o efeito colateral de se estar crescendo. Nós nem notamos, nosso dia é tão bagunçado, mas estamos crescendo.
E eu não sei se quero crescer.
Já me disseram que eu sou infantil e eu pensei "puxa, me acho tão madura". Mas a verdade é que eu sou realmente infantil. Vou com a minha prima ver filme e choro com as animações da Disney, sou a única que se levanta pra torcer em voz alta pelos personagens, que brinca de fazenda com o primo de oito anos. E que se dane se as garotas da minha idade já têm filhos, eu gosto de ser assim. Gosto de ainda enxergar a magia das coisas, de escrever carta para o Papai Noel no Natal (mas se bem que ano passado eu nem fiz isso ;/), de poder achar graça em desenho animado. 
Mas vai contra as leis da natureza não crescer, a gente sabe. Sabe que vai ser taxado de imbecil se continuar com os hábitos de criança. E daí vamos nos envolvendo mais e mais em coisas "de adulto". Temos que planejar nosso futuro e começar a nos preocupar com coisas mais importantes. E, quando vemos, os desenhos animados não fazem mais sentido e você não tem mais saco para brincar com crianças porque sua mente está cheia de problemas.
Ou seja, crescer é chato.

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Peter Pan concorda comigo

terça-feira, 9 de julho de 2013

Eu "aproveito"

Eu tenho um trabalho maldito em falar sobre sentimentos. Escrever sobre momentos flui perfeitamente bem, mas quando a coisa deixa de ser concreta e passa a ser um monte de sensações que se misturam dentro do peito e que precisam ser decifradas para que as coisas realmente deem certo, eu penso: estou perdida. Porque eu não entendo o que se passa comigo. Eu analiso psicologicamente as pessoas todos os dias. Perguntas como "o que ele pensou ao dizer isso?", "qual o sentido daquela ação?", "eu entendi certo?" são feitas e meio que respondidas de um jeito torto por mim a toda hora. Mas quando a coisa deixa de ser alheia e passa a ser minha, eu não sei o que fazer. Por que eu disse aquilo? Por que cargas d'água eu não fiz o que vinha planejado fazer há dias? Eu não sei. Mesmo que eu olhe bem no fundo da minha alma, eu não sei por que fiz tudo errado.
E não dá pra fazer de novo. Veja bem, eu só tenho uma única vida e tenho o maior medo de ferrar com ela. Tenho um medo terrível de perceber como eu desperdicei todos os meus momentos aqui na Terra, ou mesmo que desperdicei minha adolescência correndo atrás de livros pra ver se tenho a mínima chance de passar no primeiro vestibular de Medicina que eu fizer e, ao entrar nele, perceber que nem era o que eu queria. Mas o que eu posso fazer além de arriscar todas as minhas chances nisso e fazer figa com os dedos bem apertados para que a vida seja boa comigo e tudo dê certo? 
Às vezes vêm pessoas me dizendo para "aproveitar a vida". Entendam, pessoas, eu não tenho vivência alguma, então não tenho a mais remota ideia do que seja "aproveitar". Aproveitar seria sair sem rumo por aí à espera de momentos que poderiam render um bom filme? Seria deitar de barriga para cima na grama verde e fofinha enquanto se observa estrelas? Seria sair se vangloriando por ter pego um monte enquanto colônias de bactérias se instalam na sua boca? Quando me dizem para sair da minha casa e aproveitar minha curta existência, eu rio para mim mesma e penso: estou tentando, será que você não vê? Acontece que esse verbo tem concepções diferentes para cada um de nós. É claro que a minha concepção pode estar errada e a sua, certa. Por isso eu tenho medo.
Eu tento aproveitar a única vida que tenho, mas eu não sei se estou fazendo isso do jeito correto. Eu tento não pensar muito sobre o que farei se no futuro perceber que todos os meus sonhos não se realizaram. Eu assisto a comédias românticas para ver se o fluxo descontrolado de pensamentos da minha mente se acalma um pouco, mas só o que penso é que eu nunca terei um amor feito o de filmes para chamar de meu. E aí sinto como se todos os meus dezesseis anos tivessem sido horríveis, e fico pensando que tudo seria diferente se eu tivesse dito isso e não aquilo. Se tivesse feito assim e não assado. Se tivesse usado a concepção de "aproveitar" dos outros e não a minha. 
E é nesse pé em que eu estou nesse dia nove. Tentando trazer alguma lógica à minha vida, e um pouquinho de consolação também, enquanto "aproveito" minhas férias na presença de um bom e insistente resfriado.

Fuck My Life
E não, isso não é bom...

quinta-feira, 4 de julho de 2013

5 minutos da minha vida que eu não terei de volta*

Estava eu, acho que nas minhas férias passadas (não lembro bem), à procura de um vlog estrangeiro para treinar meu horrível listening, e acabo encontrando o JacksGap e, claro, me apaixonando pela fofura imensa dos dois gêmeos com o sotaque britânico mais bonito que existe: Jack e Finn Harries.

Jack and Finn Harries <33 stop being so perfect

Os vídeos deles são curtinhos e muito divertidos. Eles não falam tão difícil e nem tão rápido, então dá para entender sobre o que eles estão falando, mesmo que você não entenda palavra por palavra. Na época em que eu os conheci, eles tinham pouco mais de 40 vídeos (hoje eles têm cinquenta, não são lá muito assíduos, geralmente o tempo de um vídeo para outro é de um mês, embora eles digam "see you next week" ao fim da gravação) e eu vi TODOS em dois dias, apertando replay sempre pra entender uma palavra ou expressão que me escapava. 
A ideia começou com o Jack. Ele, sozinho, criou um vlog para contar sobre as aventuras que ele pretendia fazer no ano inteiro livre que ele tinha antes de entrar na faculdade. Por isso o "gap", a ideia inicial seria relatar as viagens e as maluquices nesse intervalo que ele tinha na sua vida entre o ensino médio - que ele tinha acabado - e a faculdade que estaria por vir e o transformaria em alguém adulto e sem tempo. Acontece  que as coisas foram um pouco mais além do que ele esperava: o Jack e também o Finn já estão na faculdade, mas continuam com o seu canal no Youtube para alegria geral.
Segundo fontes, e falo assim genericamente por não me lembrar onde eu li tal informação, o Jack mal era assistido nos seus primeiros vídeos. As coisas começaram a mudar quando ele apresentou a sua cópia genética, o Finn, para o mundo no seu oitavo vídeo. Logo, logo o Finn estava sendo saudado com a frase " Finn, the better twin" e eu fico feliz por o Jack não ficar chateado. Na verdade, os dois têm uma relação muito boa. O Jack é mais espontâneo e fala pelos cotovelos, enquanto o Finn é bem na dele e tem um quê misterioso no olhar. Não sei como tem gente que escolhe seu preferido. Os dois, à sua maneira, são adoráveis.

(100+) Tumblr
acho que o Finn é o da esquerda e o Jack, o da direita, MAS SÓ ACHO porque né, olhem para esses rostos perfeitamente iguais!
Só avisando de antemão: ao assistir aos vídeos dos dois, não fique perto de alguém que não goste de ouvir gargalhadas, porque é certeza que você vai rir muito. Também não entre em depressão quando te der uma vontade imensa de conhecer Londres e você descobrir que não tem dinheiro para isso: eu também não tenho e estou aqui, vivendo minha vida numa boa - ou quase. Não se apaixone, é quase evidente que eles são comprometidos. Eles recebem correspondência e abrem as cartas em uns vídeos que eles chamam "twin mail", mas faz tanto tempo que eles abriram cartas pela últimas vez que acho que a correspondência empilhada chega às nuvens. Anyway, você pode mandar uma cartinha para eles! Saiba que eles gostam muito de doces.

Um dos primeiros vídeos que eu assisti. Esses dois são amor, somente <3

* "5 minutes of your life that you won't get back" é o slogan deles que teve várias adaptações em forma de músicas feitas por fãs e até pela prima deles, uma mais viciante que a outra. E, só pra constar, eu perdi muito mais do que cinco minutos com eles.

quinta-feira, 20 de junho de 2013

Não fui às ruas

Esse poder revolucionário que tomou conta do Brasil também tomou conta de mim. Acho que todos nós estávamos cansados. Os vinte centavos foram o estopim de que precisávamos - e quem dera se eles tivessem vindo antes, digo até. O Brasil inteiro, finalmente, acordou de um sono longo e profundo, tomou às ruas e começou a lutar pelos seus direitos mais básicos. Isso é democracia: não ficar impassível aos descasos. Era só ver os primeiros protestos na TV para eu pensar que talvez ainda haja solução. 
Apesar da minoria com titica na cabeça que resolveu protestar achando que sabia como, a coisa toda me é linda demais. E eu fico imaginando como podemos fazer coisas grandes quando queremos. É bom saber que podemos levar milhares de pessoas às ruas, chamar atenção da mídia internacional, ter nossas exigências atendidas. 
Foi com o coração partido em pedaços bem miúdos que eu não fui ao protesto hoje. Minha mãe não é uma pessoa muito fã de coisas ditas "perigosas" assim. Insisti feito louca, mas ela bateu o pé e disse não. E quando minha mãe bate o pé, a situação está perdida. 
Acompanhei todo o desenrolar da coisa em casa. Também vi a já citada minoria com titica na cabeça fazer besteira, como era provável que acontecesse. E não acho que esses atos de vandalismo (os mais noticiados pela mídia, vejam só que coisa) façam a luta ser menos importante do que é. Tem gente honesta protestando sim, mas tem babaca também. Mas não esqueçamos do fato de que existem babacas em todos os lugares.
Só queria mesmo deixar claro e por escrito que eu apoio veementemente e também faço parte da luta, não fui às ruas por motivos de causa maior (sim, mães são causas maiores, afinal), mas acho que já estava na hora de mudar o sistema. Um governo para e pelo povo, senhores políticos, façam a gentileza. 

filho teu não foge à luta, Brasil

sexta-feira, 14 de junho de 2013

Sou feminista


Percebi que, ultimamente, tenho falado de coisas muito importantes para mim. Diria até que coisas importantes e complicadas demais para alguém com a minha idade (como aqui e aqui). E agora venho falar de coisa importante novamente. O que eu posso fazer se são coisas assim que passam pela minha mente? 
Não vou dizer que sou expert no assunto, porque feminismo é uma coisa nova para mim. Há só mais ou menos um ano que eu vim começar a ler e a entender sobre a luta das feministas. Eu já guardava comigo alguns questionamentos, já dizia para quem quisesse ouvir que eu não ia ser dona de casa coisíssima nenhuma, que não ia viver em função do meu marido. Tá com fome? Cozinhe. Tá achando a casa suja? Limpe, ué. Principalmente porque eu odeio mais que tudo tarefas domésticas e estou muito bem assim, muito obrigada. Também notei logo a falta de personalidades femininas nos livros da escola. Cadê as físicas? As químicas? As biólogas? Em que lugar elas estavam que não descobriram nada para a ciência? E, veja bem, a nossa sociedade é tão nitidamente machista nesse sentido, que ao menos a palavra "gênia" existe. Por isso a necessidade do feminismo. Mas o que é isso, afinal?
O feminismo é, basicamente, a luta das mulheres por igualdade em todos os âmbitos da sociedade. A luta por liberdade, por direitos. O resto que se vê por aí é simplesmente bagunça. Feministas não praticam a misandria, o que é meio óbvio, já que elas lutam por igualdade e não seria igualdade se um sexo tentasse se sobrepôr a outro; feministas não são necessariamente lésbicas, a opção sexual não tem nada a ver nessa discussão: você luta a favor das mulheres? Você não concorda com a sociedade patriarcal de hoje? Independentemente da sua opção sexual, você é uma pessoa feminista; não é uma luta só das mulheres, existem vários homens que querem ver as mulheres sendo tratadas exatamente da mesma forma que eles, porque, além das diferenças biológicas básicas, não somos diferentes em nada e temos a mesma capacidade.

 

Assim como toda ideologia, existem subgrupos dentro do feminismo. Algumas mulheres são extremamente radicais, já outras - como eu -, talvez por ainda serem inexperientes, ainda se encantam com um homem dito "cavalheiro", mesmo sabendo que não deveriam. Cavalheirismo é machismo. O homem não abre a porta, puxa a cadeira ou leva as compras para você porque ele é gentil, ele o faz pensando em recompensas, sempre com segundas intenções. Ou você acha que ele puxa a cadeira para o amigo sentar? Nós, mulheres, não precisamos disso. Podemos muito bem pagar a conta do jantar sozinhas, não somos mais frágeis, mais delicadas do que eles, somos iguais.

Já vi muito.

Eu sou a favor da descriminalização do aborto, como acho que a grande parte das feministas são. Devo confessar que eu, particularmente, não abortaria. Mas defendo o direito e a vontade das outras mulheres. O corpo é delas. A vida é delas. Quem sou eu para dizer "você não pode!"? Que criança nascerá dessa gestação não desejada? 
Aborto é crime no Brasil, mas isso não faz com as mulheres deixem de abortar. Muitas morrem em clínicas clandestinas, com gente despreparada. Que tal legalizar? O número de abortos não vai diminuir, mas o número de mulheres mortas sim. Feminista é sim a favor da vida, afinal, a favor da vida da mulher! É contra o aborto? Sua religião diz que é pecado? Ótimo, não aborte. É simples, gente.
Uma vez eu vi uma imagem que dizia algo tipo "quer irritar uma feminista? Diga-lhe que é mãe" e eu juro que não entendi. Eu quero demais ser mãe e nem por isso deixo de ser feminista. Só quero um mundo mais igualitário, onde as mulheres sejam tratadas como pessoas, onde as suas vontades sejam respeitadas. Será que se fosse o homem que engravidasse, e não a mulher, estaríamos tendo essa controvérsia?


Menos da metade das mulheres são feministas. Ou seja, é uma corrente feita para as mulheres, lutando a favor de melhorias na vida das mulheres, despindo a mulher da ideia de ser unicamente útil para reprodução, mostrando que as mulheres são tão igualmente capazes como os homens, querendo que o sexo feminino seja levado a sério nessa sociedade: que mulher não seja julgada por não seguir os padrões de beleza impostos, que mulher não seja tratada como mero objeto de deleite masculino, que as tarefas domésticas e a criação de filhos seja realizada pelo casal e não só pela mãe, que a mulher não seja julgada por escolher profissões "de homens", é uma corrente feita para acabar de uma vez com o machismo da sociedade, com a ideia de que o homem é superior à mulher, é uma corrente criada para dar à mulher aquilo que lhe foi negado por milhares de anos e sim, você leu certo: MENOS DA METADE das mulheres são feministas. É como se você desse dinheiro a alguém pobre e ele simplesmente jogasse fora. 
Sou feminista, mas esse é um processo lento de construção. Vivemos tão presos às amarras patriarcais que sequer damos conta quando fazemos/dizemos algo machista. Contudo, desde o dia em que eu li sobre o feminismo pela primeira vez, vou crescendo um pouco, aprendendo mais. É assim mesmo: um degrau de cada vez. Quem sabe, um dia, eu atinja o topo da escada.